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- JANUS 2004 -

Janus 2004



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A Europa Ocidental

Isabel Meireles *

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O principal espaço das relações externas portuguesas situa-se hoje, evidentemente, na Europa Ocidental: um espaço que nos é familiar, uma espécie de casa comum. Todavia, estamos demasiado habituados a identificá-lo sumariamente com a União Europeia. Ora, se é verdade que os 15 países da UE formam o mais importante conjunto, também é verdade que existem alguns outros cuja referência se impõe: os 4 membros da EFTA, a saber a Suíça, a Noruega, a Islândia e o Liechtenstein (ver Informação Complementar), bem como as 4 cidades-Estados do continente — Andorra, Mónaco, San Marino e Vaticano —, além da ilha de Malta, já a meio caminho do Norte de África. A prioridade das análises vai obviamente para a União Europeia, tanto mais quanto temas de actualidade assinalam a sua evolução presente e são tratados em diversos momentos deste Anuário.

 

A correlação de forças na união Europeia

O modelo de construção comunitária teve, desde a sua génese, dois países que se assumiram e comportaram, ainda que diferentemente em termos de forma e de circunstancialismos, como os mentores de todo o processo de construção europeu.

A Alemanha, como vencida das duas guerras mundiais, mas ainda suficientemente temível e poderosa para ser associada à criação das Comunidades, renasceu rapidamente das cinzas e partilhou as rédeas do protagonismo europeu com outro líder carismático do processo, a França. Este país desenhou, sob os auspícios do general De Gaulle, uma Europa que tem vindo a pretender um projecto consentâneo com as características históricas e culturais do velho continente, orgulhoso da sua tradição de berço civilizacional, desejosa de emancipação psicológica e, por isso, pugnando por cortar o cordão umbilical com o novo continente e esvaziar o líquido amniótico do Atlântico.

Por causa desta linha de plano director estratégico, não se tratasse de um militar experimentado em outras batalhas, foi durante alguns anos possível à França do general impedir a entrada de outro grande protagonista da cena europeia actual que é o Reino Unido. O seu pendor definitivamente atlântico em termos geo-políticos, aliado ao facto da mentalidade própria do ilhéu que tem que sobreviver à situação de míngua territorial e de horizontes, evitando os perigos da canibalização, traduzida num calculismo vertido em mercantilismo judaico, faziam crer aos responsáveis franceses que o Reino Unido seria o cavalo de Tróia da cidadela comunitária.

Este país, com a sua entrada hesitante apenas forçada por receios de isolacionismo e por falhanço de projectos concorrentes com a ideia de uma Comunidade concebida como uma zona de livre troca, como a EFTA, ou o romper de teias que não se cerziram, como o Commonwealth, levaram a que o Reino Unido tivesse uma influência determinante ao longo destas décadas como travão da construção europeia. No contraponto, o pedal do acelerador foi assumido numa dualidade até há pouco tempo coesa, pela Alemanha e pela França pós-gaullista, numa gestão intrincada a nível externo de interesses próprios antagónicos, em que a diplomacia continental fervilhou de actividade, nem sempre ajudada pelos jogos de democracia interna que ameaçavam, por vezes, alterar após cada eleição os pressupostos de acção entretanto adquiridos. Como, aliás, actualmente é mais visível.

A circunstância da bipolarização do continente europeu levou os parceiros condutores a encontrar soluções, forçadas pelo sentimento de quem está sitiado numa fortaleza paliçada pelo oceano e por um muro de Berlim, o que desenvolveu um espírito de coesão amalgamado pelo cimento da identificação de uma ameaça comum vinda do Leste. Com a reunificação alemã, a nova República Federal tentou melhorar a sua posição de parceiro comercial, especialmente com a Rússia, no sentido de procurar novos mercados e investimentos e um acesso estável ao sector energético e de matérias-primas, fixada pelos tratados da era Gorbatchov, no quadro das relações económicas com a Alemanha reunificada. E os objectivos políticos desembocaram sempre em desideratos económicos porque, ao contribuir materialmente para a integração da Rússia na nova ordem internacional, a Alemanha promoveu a interpenetração daquela economia no novo espaço económico europeu, enquanto procurava, concomitantemente, garantir condições de vida mais dignas aos dois milhões de alemães que aí habitam. Contudo, estas esperanças foram sendo goradas, sobretudo devido à contracção económica da Rússia dos anos 90 provocada, no fundamental, pelo esboroar das estruturas estatais sem a correspondente resposta concorrencial dos privados, aliado à falta de continuidade, de erros e inconsistências no plano externo da respectiva política económica.

Com algumas diferenças profundas, foi isto o que aconteceu em relação a outros países da órbita da ex-União Soviética, o que deu, ainda que momentaneamente, algum alívio aos parceiros europeus, conhecida que é a natural vocação da Alemanha para se identificar e expandir para esta área geográfica. De resto, é por isso que também muitos Estados membros não contestam, mesmo podendo fazê-lo, o protagonismo no âmbito da União Europeia da Alemanha reunificada, para a continuar a manter amarrada e controlada a um projecto comum, garante da paz da democracia e, em consequência, de prosperidade e desenvolvimento. Estes equilíbrios, porém, não dependem apenas das nações europeias, mas fundamentalmente dos funambulismos políticos internos imprevisíveis e, por isso, difíceis de gerir. Por isso, a correlação de forças e de equilíbrios na União Europeia tem também que ser analisada do ponto de vista das políticas e dos políticos.

Foi isto que aconteceu com a Alemanha no passado e acontece, ainda, depois da reunificação, com a figura do chanceler Kohl que, devido ainda à memória e culpabilidade germânica de genocídios mundiais que foram a vergonha da humanidade neste século, não desistirá facilmente do objectivo de construção europeia ao qual ligou indelevelmente o seu destino político. Este chanceler que governa a Alemanha há catorze anos, ultrapassando em termos de longevidade política o próprio Adenauer, nunca teve, como agora, uma margem tão estreita de manobra gerada pelas divisões no interior da coligação entre democratas cristãos, sociais-cristãos e liberais que governa e por uma oposição social-democrata afastada há muito tempo e ansiosa de tomar o poder e, ainda, contra as temidas sondagens que o dão, antecipadamente, como vencido nas próximas eleições. É da capacidade de Kohl resolver ou ultrapassar estas dificuldades e, uma vez mais, da sua criatividade, que depende, em muito, o futuro da Europa.

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No auge de todas estas incertezas, encontra-se no tandem do frouxo acelerador europeu o recém-chegado Lionel Jospin, eleito pelo voto do descontentamento e, também, por isso, sem capacidade de manobra, acrescida pela perplexidade do inesperado, pela inexperiência governativa e, sobretudo, devido ao facto de ter ficado refém das promessas eleitorais capitalizadas na sua vitória. Duas semanas após a sua eleição, Jospin conseguiu instalar a crise no eixo Paris-Bona nas vésperas da cimeira de Amesterdão que já se anunciava com nuvens e mau tempo e a que se juntou a turbulência gerada pela questão do euro, concebido forte na visão germânica em moldes financeiros estritos, tal como tinha sido negociado em Maastricht, contraposta a uma visão gaulesa de flexibilização conseguida através de uma leitura política dos critérios de convergência nominais e com o acento tónico no objectivo da criação de empregos. A eleição de Jospin funcionou ainda a nível de outros governos europeus como uma espécie de detonador contra a ortodoxia financeira de Bona, desejosos de ganhar dividendos políticos junto dos seus eleitores que, reconhecidamente em face da crise instalada, fazem da construção europeia o bode expiatório, aumentando, em crescendo, a onda de eurocepticismo que tem dificultado outros avanços da União Europeia.

 

A difícil gestão dos equilíbrios

O que se assiste no panorama europeu actual é, assim, a uma desaceleração, mesmo a uma paragem do processo de construção comunitário, devido, no fundamental, às dificuldades endógenas e exógenas do acelerador desta construção feita, pelo menos no passado, quase sempre em uníssono, pela França e pela Alemanha. Também o travão comunitário precisa na actualidade de ajustamentos, porque já não funciona afinado e ao menor toque, como no passado recente com Margaret Thatcher, apelidada, com justeza, de Dama de ferro. Embora fosse um período conturbado, os avanços europeus durante o seu consulado foram realistas e impediram que se progredisse para formas visionárias de integração das quais seria necessário regredir penosamente a morder fracassos fatais.

Por outro lado, a eleição de Tony Blair foi acompanhada por uma onda de optimismo pelos Estados membros cansados, sobretudo do bloqueio sistemático e surdo do seu antecessor John Major, manietado em primeira linha pelos eurocépticos do seu partido. O novo estilo de Blair afrouxou o travão britânico ao revogar a cláusula de 'opting out' negociada pelo seu antecessor relativamente ao protocolo da política social, subscrevendo as preocupações sobre o emprego dos seus parceiros europeus e, ainda, retirando as objecções à inclusão do Acordo de Schengen relativamente ao Tratado de Amesterdão. Mas, no essencial, as posições de eurocepticismo dos britânicos mantêm-se idênticas, sem desejos de aderir a uma União Económica e Monetária e, menos ainda, de progredir na senda de uma União Política.

Pode dizer-se, em suma, que os jogos de poder e de contrapoder estão centralizados num tríptico que assenta na França, Alemanha e Reino Unido enquanto os outros Estados membros apenas desempenham, de forma pontual, um papel determinante e, mesmo assim, quase sempre em questões marginais. Tal como num carro, também na condução da coisa comunitária existe acelerador e travão, o que é salutar nesta mecânica, pois a falta de um deles implica velocidades descontroladas ou uma inércia não recomendável no evoluir de caminhos traçados. Algumas explicações para certas dificuldades que hoje experimenta a União Europeia residem no facto de ambos os mecanismos de aceleração e de travagem, protagonizados pela citada tríade de Estados e políticos, funcionarem hodiernamente de forma deficiente ou com pouca margem de manobra. Pode, assim, construir-se um cenário de afinação de poderes ou da sua alteração, ou até mesmo da entrada em cena de novos países líderes do processo de construção da União Europeia. Com as turbulências a Leste e a pressão dos países da bacia do Mediterrâneo, conjugadas com as próprias instabilidades dos governos e das opiniões públicas, pode dizer-se que nada será previsível na cena europeia e na respectiva correlação de forças e gestão de equilíbrios, a não ser a própria imprevisibilidade.

 

Informação Complementar

A EFTA

A European Free Trade Association (Associação Europeia de Comércio Livre) foi fundada em 1960, à maneira de uma réplica – liderada pelo Reino Unido – à então recente Comunidade Económica Europeia. Até 1995 ainda era composta por sete países, mas a entrada da Áustria, da Finlândia e da Suécia na UE reduziu a quatro os actuais membros da EFTA: Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça. A sua sede é em Genebra e o seu Secretário Geral é um islandês, Kjartan Johannsson,

Dos actuais membros, três integram a AEE – Área Económica Europeia, em associação com a UE: a Islândia, o Liechtenstein e a Noruega. Quanto ao quarto membro – a Suíça – está "cercada" pela União Europeia e a sua economia tem um elevado grau de inserção nesse espaço. A EFTA assinou também acordos comerciais com dez diferentes países da Europa Central e Oriental.

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* Isabel Meireles

Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Diplomada em Altos Estudos Europeus no College d’Europe de Bruges na Bélgica. Mestre em Direito Comunitário e Política Internacional. Comentadora da TSF de assuntos europeus e comunitários.

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