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Janus 2001



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A economia portuguesa e a transição para a moeda única

Francisco Mendes *

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A adopção do euro como moeda única oficial para todo o espaço da zona euro (UE 11) é um evento do maior significado político e económico, representando um marco decisivo no processo de integração e na própria história da Europa contemporânea. Embora a UEM possa ser perspectivada como o corolário natural do Mercado Comum, traduz um passo qualitativo de enormes proporções no aprofundamento da integração europeia. Por outro lado, dada a impossibilidade de prever todas as suas consequências futuras, a unificação monetária representa igualmente um verdadeiro salto em terreno desconhecido para o qual não existem antecedentes a proporcionar orientação segura.

Tendo em conta a complexidade do projecto, os objectivos em vista e as grandes diferenças estruturais entre as economias do "núcleo duro" do centro da UE (de influência alemã) e as economias periféricas do sul (Itália, Espanha, Portugal, Grécia e, também, a Irlanda), que as afastava significativamente do conceito de uma zona monetária óptima ou, no mínimo, viável, o Tratado da União Europeia perspectivou a realização da UEM de forma gradual em três fases. A primeira decorreu entre 1 de Julho de 1990 e 31 de Dezembro de 1993 e respeitou basicamente ao reforço da coordenação das políticas económicas e monetárias entre os EM e à liberalização dos movimentos de capitais no espaço europeu. Na segunda fase, que terminou em 31 de Dezembro de 1998, intensificou-se a convergência das economias dos EM, nomeadamente nos domínios da inflação, das taxas de juro de longo prazo, da disciplina orçamental e da estabilidade cambial, através do cumprimento dos critérios de convergência.

Desde a adesão à CEE, em Janeiro de 1986, iniciou-se em Portugal uma mudança gradual de regime económico, orientado para a estabilidade macroeconómica. Essa evolução viria a intensificar-se ao longo da década de 90, num processo de convergência real e nominal, nem sempre linear, sendo a preparação da economia portuguesa para a UEM uma opção estratégica da política económica nacional. São inegáveis os progressos registados na economia portuguesa nos últimos 10 anos (em especial ao nível das infra-estruturas) embora a eficiência e a competitividade da generalidade das empresas portuguesas estejam ainda a grande distância da média das empresas da UE.

Em resultado da acção conjugada de políticas macroeconómicas e estruturais, de um enquadramento externo geralmente favorável e de um significativo auxílio financeiro da UE, através dos fundos estruturais e do Fundo de Coesão - e apesar das consequências da recessão europeia de 1992-93 - o PIB per capita que, em 1985, era ainda da ordem de 50 % da média comunitária, ascendeu a cerca de 70 % no final da década de 90.

Mas foi em matéria de convergência nominal que ocorreram os progressos mais notáveis, permitindo que Portugal viesse a cumprir os critérios de convergência e a integrar o núcleo inicial da moeda única (ver caixa). Este esforço de convergência nominal não deixou de ter os seus custos, em termos de crescimento económico e de empregos sacrificados, mais visíveis no período 1991-95.

A adopção do euro permitirá a eliminação do risco cambial e dos custos de conversão nas transacções com o exterior liquidadas nessa moeda. Esse benefício será particularmente significativo para Portugal tendo em conta o elevado grau de abertura da economia ao exterior e o grande peso do comércio intracomunitário nas trocas comerciais externas (cerca de 80 %).

Um dos maiores benefícios para Portugal deverá advir da condução da política monetária única a definir pelo Banco Central Europeu (BCE). O BCE gozará de elevada independência e terá como objectivo final prioritário a estabilidade de preços na área do euro. A definição da política cambial da UE11 caberá ao Conselho de Ministros das Finanças (Ecofin), mas a sua execução será da competência do BCE.

A actuação do BCE deverá proporcionar um ambiente sustentado de reduzida inflação e, consequentemente, de baixas taxas de juro, a curto e a longo prazos, induzindo uma acumulação mais rápida do capital público, do capital humano e do capital privado, favorável, assim, à expansão do investimento produtivo e ao aumento do produto per capita. Do lado da procura, o baixo nível das taxas de juro contribui para uma dinâmica de crescimento da procura interna no curto/médio prazos através da redução das restrições de liquidez das famílias e dos custos financeiros das empresas.

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A não participação no grupo inicial da UEM não só tornaria inglório todo o esforço e custos anteriores, como diminuiria a credibilidade da economia portuguesa, originando maior instabilidade financeira e cambial e aumento do prémio de risco, conduzindo a um nível mais alto de taxas de juro. Do mesmo modo, a inclusão de Portugal no conjunto dos EM fundadores do euro, além de reforçar a resistência da economia portuguesa aos efeitos da turbulência financeira e cambial associada às crises que vêm assolando os mercados financeiros mundiais, possibilita que o país participe no centro das grandes decisões evitando, assim, o perigo de aumentar a sua perifericidade político-económica.

A integração europeia funciona também como um estímulo à modernização da economia e à tão necessária mudança de mentalidades dos agentes económicos e sociais, essencial ao reforço da competitividade da economia portuguesa. Quanto aos custos, os mais importantes resultam da perda de autonomia da política monetário-cambial nacional, como instrumento de regulação macroeconómica interna.

Com efeito, a condução de uma política monetária única – definida pelo BCE para todo o espaço do euro e basicamente orientada para a estabilidade dos preços – significa que eventuais problemas específicos que venham a afectar a economia portuguesa (recessão económica, aumento do diferencial da inflação face à média comunitária, agravamento da competitividade-preço, choques económicos adversos, etc.) já não poderão ser tratados através de variações das taxas de juro e de câmbios.

Há quem minimize esses riscos, argumentando que a anterior margem de manobra no domínio monetário-cambial era já muito limitada desde a adesão do escudo ao mecanismo de taxas de câmbio do Sistema Monetário Europeu (SME) e da completa liberalização dos movimentos de capitais e que, por outro lado, a desvalorização cambial não é eficaz, fortalecendo as expectativas inflacionistas.

Convém, porém, não esquecer que o conceito de estabilidade cambial do SME – com uma larga amplitude de variação a permitir realinhamentos cambiais – é muito diferente do regime de moeda única da UEM e que a desvalorização cambial tem provado ser um instrumento de ajustamento relativamente apropriado em certos casos concretos no passado. Embora o avanço na integração europeia deva contribuir para reduzir as possibilidades de ocorrência de choques assimétricos, as fragilidades e vulnerabilidade ainda existentes no aparelho produtivo nacional não permitem afastar completamente essa eventualidade.

De facto, Portugal ainda evidencia um peso do comércio inter-industrial nitidamente superior à média comunitária, com forte especialização em produtos mais vulneráveis à acrescida concorrência de países com custos unitários de trabalho mais baixos, o que pode tornar os choques menos uniformes nos seus efeitos. Essas assimetrias podem igualmente ser intensificadas pelas diferenças nos mecanismos de transmissão da política monetária.

O alargamento e a abertura da UE aos países da Europa Central e de Leste (PECO), actualmente em processo de negociação (que se antevê difícil e moroso), constitui outro grande desafio que a economia portuguesa terá de enfrentar no futuro próximo.

É de prever o aumento da concorrência dos PECO com especialização sectorial semelhante à de Portugal (têxteis, vestuário e calçado), mas com níveis salariais acentuadamente mais baixos. Essa situação poderá ser ainda agravada com a gradual liberalização do comércio mundial, nomeadamente no sector dos têxteis.

Mas os PECO são também concorrentes com Portugal na atracção do investimento externo e, principalmente, na captação dos fundos estruturais comunitários, por terem enormes atrasos em matéria de infraestruturas. Com efeito, a situação actual (Janeiro-99) do debate relativamente ao futuro quadro orçamental da UE – a Agenda 2000 – indicia que Portugal pode vir a ser grandemente penalizado na repartição de fundos no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio (QCA III), a vigorar entre 2000 e 2006, em resultado conjugado do aumento dos candidatos e da "avareza" dos países ricos da UE (em particular da Alemanha), que pretendem reduzir a sua contribuição.

O lançamento do euro ocorreu num ambiente de nítida deterioração do enquadramento macroeconómico internacional. A recessão no Japão continua a condicionar negativamente os países asiáticos, a Rússia está mergulhada em profunda crise económica e financeira (de consequências imprevisíveis) e os efeitos de contágio transmitiram-se à economia brasileira existindo o perigo de alastramento a outros mercados emergentes da América Latina. Essa situação tem ocasionado revisões em baixa das projecções de crescimento da economia mundial, prevendo-se desaceleração das economias da UE (com particular relevo para a Alemanha e a França) em 1999, com ligeira recuperação em 2000. Prevê-se, assim, o abrandamento do crescimento da economia portuguesa no triénio 1999-2001 para um valor médio pouco acima de 3 % (inferior aos 4 % em 1997-98), mas ainda superior ao crescimento médio previsto para a UE11.

Afigurando-se pouco provável, não será, porém, completamente de excluir um cenário mais pessimista – no contexto de um agravamento da crise financeira internacional – a originar quebras mais pronunciadas no produto da UE e, consequentemente, de Portugal em 1999 e 2000.

 

Informação Complementar

O Processo Desinflacionista da Década de 90: Uma História de Sucesso

Há seis ou cinco anos atrás, poucos analistas, portugueses ou estrangeiros, estariam dispostos a apostar que Portugal viria a integrar o conjunto de países fundadores da área do euro (UE11). Com efeito, em 1990 a inflação média anual em Portugal ainda era superior a 13 %, os diferenciais das taxas de juro em relação à média da U.E. eram muito elevados e os indicadores de sustentabilidade das finanças públicas (avaliados pelos indicadores do peso do défice e da dívida pública no produto) apresentavam valores bastante desfavoráveis.

A partir de 1990, a convergência da taxa de inflação para a média comunitária processou-se de forma ininterrupta até Fevereiro de 1999. Entre Dezembro de 1990 e Fevereiro de 1999, a taxa de inflação média reduziu-se em 11,3 p.p.. Tomando como referência o índice de Preços no Consumidor Harmonizado (IPCH) - mais indicado para comparações internacionais - a inflação média atingiu pela primeira vez um nível inferior a 2 % em Dezembro de 1997 (1,9%) valor já compatível com a estabilidade dos preços, segundo o critério do BCE, e muito próximo da média comunitária. Para o êxito desta política, foi decisiva a opção da estabilidade cambial do escudo como objectivo intermédio da política monetária. A política de luta contra a inflação contou também com uma elevada flexibilidade dos salários nominais e com o apoio de um ambiente global favorável, com especial relevo para a redução dos preços internacionais das matérias-primas e da energia e a desaceleração geral da inflação nos países industrializados, em particular na U.E.

Em 1998, verificou-se um aumento da inflação, subindo a taxa média do IPCH de 1,8 % em Janeiro para 2,3 % em Dezembro, elevando, assim, o diferencial face à média da UE11 para cerca de 1,0 p.p. (1,6 p.p. em variação homóloga). Este agravamento (mais nítido no comportamento dos bens transaccionáveis alimentares) está associado à depreciação do escudo em 1997 e início de 1998, ao dinamismo da procura interna e à realização da Expo98.

No novo contexto da política monetária única para todo o espaço do euro, é evidente que já não há lugar à utilização de medidas de política monetária dirigidas especificamente à inflação em Portugal, tanto mais que o seu peso relativo no conjunto da UE11 é pouco representativo (cerca de 2 %). Elevados diferenciais de inflação em relação à média da UE11 irão, porém, levantar problemas de competitividade às empresas portuguesas. O esperado abrandamento da economia portuguesa em 1999 deverá contribuir para atenuar as pressões inflacionistas, sendo, no entanto, natural que Portugal continue a evidenciar uma inflação ligeiramente superior à média da UE11, essencialmente relacionada com o comportamento dos preços dos bens não transaccionáveis, como consequência do processo de convergência real.

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* Francisco Mendes

Licenciado em Organização e Gestão de Empresas pelo ISCTE. Docente na UAL.

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