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O alargamento da união Europeia e os equilíbrios europeus

José Manuel Félix Ribeiro *

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O alargamento da União Europeia atinge de modo distinto três dos principais actoreseuropeus — Alemanha, França e Espanha.

 

Alemanha

A retirada soviética da Europa central e oriental e o declínio do poder da Rússia, que lhe sucedeu, criaram uma conjuntura única para que a Alemanha pudesse ocupar uma posição de centralidade europeia; mas a reunificação alemã e o modo como foi concretizada envolvem um custo financeiro de tal modo elevado que a Alemanha não pode ambicionar explorar essa centralidade com autonomia.

A Alemanha “ganha” com o processo de alargamento a Leste da União Europeia por três razões principais:

• Consegue obter um envolvimento financeiro comunitário na estabilização de países situados na sua fronteira leste e sudeste, compensando as limitações ao seu envolvimento directo, resultantes dos custos da reunificação alemã;

• Consegue alargar substancialmente os mercados e os locais de investimento na sua proximidade, graças ao apoio comunitário a uma transição bem sucedida para a economia de mercado de um número significativo de países da Europa báltica, central e danubiana;

• Consegue alterar a sua influência nas decisões da UE graças à adesão de países que já estiveram por longos períodos de tempo na área de influência geopolítica do mundo germânico (Alemanha e Áustria) — Hungria, República Checa, Eslováquia e Eslovénia.

Mas a aceitação da influência da Alemanha no Leste será tanto maior quanto mais forte for o envolvimento dos EUA na segurança europeia através da OTAN, quer pelas garantias que esse envolvimento oferece face aos comportamentos futuros da Rússia, garantias que a Alemanha não pode dar, quer pela própria contenção na actuação externa da Alemanha, que esse envolvimento assegura.

Por outro lado, o consenso que se tem vindo a estabelecer na Alemanha entre as principais forças políticas em torno da necessidade de reduzir a contribuição da Alemanha para o orçamento comunitário pode vir a tornar mais difícil o aproveitamento da sua potencial “centralidade”.

 

França

A França “perde” com o processo de alargamento a Leste por três razões principais:

• A maior parte dos países candidatos com mais forte probabilidade de adesão no médio prazo situam-se na proximidade geográfica, económica, cultural e histórica da Alemanha e da Áustria (ou seja do “mundo germânico”), sendo muito limitados os meios directos de influência francesa sobre eles;

• Os receios dos países candidatos relativamente à Rússia e à Alemanha traduzem-se por uma clara preferência pelo envolvimento dos EUA como “potência europeia”, no quadro da OTAN, em relação a qualquer solução exclusivamente europeia que teria sempre que ser uma solução com o acordo da Rússia e no qual a Alemanha teria que desempenhar o papel central; os países candidatos à UE são grandes defensores de um alargamento rápido da OTAN;

• O alargamento a países com tão grande desnível de prosperidade relativamente à média da UE, pelos custos que envolve, vai forçar a uma revisão do modo de financiamento da UE e de algumas das suas políticas (nomeadamente da PAC), pondo em risco a excepcional assimetria entre a influência de que goza a França no “sistema da UE” e a sua contribuição líquida para o orçamento desta.

A perda com o alargamento a Leste é tão grande que a França só o pode aceitar na condição de ser aberta uma área de integração europeia em que conte ganhar substancialmente em termos geopolíticos e económicos — tal área é a Defesa Europeia:

• A construção de uma “Europa da Defesa” permitiria alterar a prazo a configuração da OTAN, de aliança entre os EUA e Canadá e treze parceiros localizados na Europa, numa relação entre os EUA e uma entidade europeia, em que a França teria um papel chave;

• A construção de uma “Europa da Defesa” poderia levar à obtenção de uma maior autonomia de decisão na política externa da UE face aos EUA, envolvendo simultaneamente uma prioridade ao investimento europeu na obtenção dos meios militares dessa autonomia (C3I e logística);

• A concretização de uma Política de Defesa permitiria consolidar uma espécie de “cooperação reforçada” europeia na Política Industrial em torno dos pontos fortes da França — aeronáutica, espaço e indústrias da defesa — combinando encomendas e financiamento da I&D. O aumento da influência da Alemanha na União Europeia, no que decorre do duplo alargamento a Leste da UE e da OTAN levará a França — ou melhor, levará uma parte da elite francesa mais esclarecida — a seguir no interior da UE uma política de alianças que tem entre os seus pilares:

• Uma aproximação ao Reino Unido, não obstante o alinhamento deste com os EUA, como forma de criar um espaço mais triangular no “topo” da UE; o que leva a França a ter de estar contra processos de deriva federal que tenham como consequência a exclusão do Reino Unido;

• Uma aproximação à Espanha — um país também fortemente ameaçado pelo alargamento, sobretudo se fosse rápido e muito abrangente, quer por razões económicas (é o maior beneficiário líquido actual) por via tanto da PAC como dos Fundos estruturais), quer por receios da diluição de influência numa EU alargada a Estados próximos da Alemanha.

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Espanha

O alargamento da União Europeia vem tornar muito visível a contradição no interior do posicionamento europeu de Espanha:

• A Espanha ambiciona ser uma potência europeia e atlântica; a Espanha pretende estar entre os grandes europeus, ao mesmo tempo que através de um investimento maciço e de alto risco na América Latina se pretende posicionar ao nível dos EUA como a segunda maior força económica externa nesta região. Apercebeu-se também que o seu maior activo externo é a comunidade hispânica nos próprios EUA e que as telecomunicações e a Internet tornam essa comunidade acessível aos serviços e conteúdos espanhóis;

• Mas a Espanha é ainda um país com um défice de desenvolvimento face ao “centro” europeu e as suas regiões mais ricas, como a Catalunha, ambicionam um posicionamento cada vez mais independente na Europa e uma cada vez maior apropriação local das receitas fiscais. O “centro” espanhol, ao mesmo tempo que cultiva ambições na Europa e no Atlântico precisa de defender na União Europeia o estatuto de país da coesão, como forma de permitir a Madrid financiar uma parte das transferências para as regiões menos desenvolvidas do território espanhol;

• A Espanha perde claramente com o alargamento, embora julgue poder ganhar com uma eventual revisão do peso relativo dos Estados-Membros nas decisões europeias, em favor dos “grandes”; mas dificilmente embarcará numa reformulação federal da Europa se tal envolver a consagração europeia de competências para as regiões que apontem para o modelo alemão, pois tal significaria uma “federalização” a nível nacional que está longe de ser consensual;

• A Espanha será pois sensível às posições francesas quanto à construção europeia; mas ao contrário da França não está prisioneira de uma ideologia anti-americana, nem as suas elites se alimentam de qualquer desconfiança visceral relativamente ao modelo anglo-saxónico de capitalismo; a Espanha tem pois uma liberdade de movimentos superior à da França e sabe que tem condições para exigir preços elevados a esta, pela sua colaboração na cena europeia.

 

Informação complementar

Portugal face ao alargamento: três vias possíveis

Portugal é confrontado, através da questão do alargamento da União Europeia com o seu modo de estar na Europa. Na década que se seguiu à adesão à CE esse modo de estar foi simples: Portugal apoiava-se numa Comissão Europeia, protectora dos Estados da “coesão” e garante do equilíbrio entre “grandes “ e “pequenos” Estados-Membros. O alargamento significa não só a adesão de Estados que se consideram justamente com direito a iguais benefícios da “coesão” como uma oportunidade para os “grandes” Estados-Membros romperem um equilíbrio que consideram injustificado. Para Portugal não basta de futuro ser pobre e diligente.

Provavelmente exige-se que escolha entre vários alinhamentos permanentes com que possa contar para defender os seus interesses, sendo que os interesses defensáveis dependem em cada caso desses mesmos alinhamentos. Sem excluir outros, três alinhamentos merecem uma maior atenção:

• “Frente Ibérica”: traduz uma preferência pela acção conjugada com a Espanha em defesa dos benefícios do estatuto de “país da coesão” na Europa, e de uma partilha de destinos na América Latina. Em ambos os casos na sombra de Espanha; é a solução mais atraente porque não tem obstáculos nem exige esforços;

• “Aliança Francesa”: foi a escolha tradicional em que tem assente a nossa presença na CE e depois na UE; demasiado pobres e periféricos para interessarmos directamente à Alemanha, foi na outra “potência” continental europeia — a França — que nos apoiámos para obter a benevolência financeira da Alemanha; apoiar esta opção para o futuro significa embarcar no sonho de uma “potência europeia” e acordar sozinho face a Espanha, o país que verdadeiramente interessa à França num período de relativo declínio;

• “Casa de Borgonha”: representaria uma ruptura no posicionamento europeu de Portugal, ao significar uma integração “virtual” no Benelux, que é um dos cinco “grandes” europeus, ao contrário de Espanha, que é o sexto; um “grande” que enquanto tiver a Holanda como pólo principal será simultaneamente atlantista e favorável a instituições comunitárias fortes, sem embarcar nas derivas federais da Alemanha; mas conviver de perto com a Holanda no mesmo espaço político significaria abandonar a mais terrível das nossas convicções actuais — a de que um país por ser pobre tem direitos; quando afinal só tem um dever: o de enriquecer.

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* José Manuel Félix Ribeiro

Licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras. Subdirector Geral do Departamento de Planeamento e Prospectiva.

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