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Janus 1997



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A Decepcionante Produtividade

Graça Franco *

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Na década de 60 foi a pedra de toque do progresso: aumentou a um ritmo bastante superior à média europeia embora nunca tenha atingido as taxas de crescimento registadas, na mesma época, em países como a Grécia. Mesmo assim, devem-se-lhe os anos de ouro do crescimento económico. A partir de 1973, e embora seguindo a tendência internacional, o seu ritmo de crescimento caiu a pique. Desde aí, o adjectivo que melhor se aplica à sua evolução é "decepcionante". Decepcionante no que se refere ao trabalho, ao capital, à agricultura, à indústria e aos serviços.

Chama-se "produtividade" e é o verdadeiro calcanhar de Aquiles do processo de desenvolvimento económico português. A produtividade pode, grosso modo, definir-se como "medida da gestão eficiente dos recursos disponíveis na economia". Um conceito suficientemente vago para permitir que a culpa da sua má evolução morra solteira. Apesar disso, se alguém sai ilibado do julgamento por "baixa produtividade" são com certeza os trabalhadores. Quando há ganhos de produtividade, a história económica recente prova que eles foram quase exclusivamente obtidos à custa do aumento da "produtividade da mão-de-obra". Fraco consolo quando se sabe que mesmo essa deixou, frequentemente, muito a desejar.

O economista e ex-ministro das Finanças José da Silva Lopes, por exemplo, não hesita em considerar "insatisfatória" — na análise que faz do desenvolvimento económico português desde a década de 60 — a evolução da produtividade da mão-de-obra com uma taxa anual de crescimento (1,6 por cento), inferior à da maioria dos países europeus, no período de 1974 a 1992. Uma evolução modesta que é vista como um dos factores que inviabilizou a melhoria dos níveis de vida nesse período, constituindo um "travão ao crescimento dos salários reais". Um andamento que teve como única vantagem o facto de ter evitado problemas muito mais graves em matéria de desemprego, num período em que, face às restrições impostas pela conjuntura externa, muito dificilmente se conseguiria um "crescimento económico mais rápido".

Mais difícil de compreender é, no entanto, o porquê de, ao longo de mais de trinta anos e de dois regimes políticos com filosofias de intervenção na economia tão distintas e políticas económicas praticamente antagónicas, os vários poderes (públicos, privados e mesmo estrangeiros) terem investido tanto na economia portuguesa e sempre tão mal. Como nota Silva Lopes, apesar dos recursos aplicados em investimento desde 1960 terem sempre superado os 25 por cento do produto interno bruto (chegando a rondar os 30 por cento entre 1974 e 1985) — podendo ser vistos como níveis de investimento na economia "muito elevados" — a verdade é que "a produtividade média dos novos investimentos deixou [sempre] bastante a desejar".

A evolução da produtividade do capital foi mesmo negativa em todo o período, provando o fracasso de estratégias tão díspares como as implícitas nos velhos Planos de Fomento, ou nos "elefantes brancos" empreendidos pelo sector público no período pós-revolução, passando por algumas das grandes apostas do capital estrangeiro como é o mais recente caso Renault. Entre 1960 e 1973, a produtividade do capital caiu 0,6 por cento contra um crescimento de 7,5 por cento da produtividade do trabalho e, entre 1973 e 1992, a produtividade do capital reduziu-se a uma taxa média anual de 1,5 por cento, enquanto a produtividade do trabalho aumentava, apesar de tudo, a uma média anual de 1,6 por cento.

 

Vícios estruturais

A explicação reside, muito provavelmente, na interpretação dos dados que justificam que o World Economic Forum considere Portugal, no seu relatório deste ano, como um dos países menos competitivos entre os 49 analisados com um modesto trigésimo quarto lugar no "ranking" global. Como única consolação resta o facto de se apresentar, apesar de tudo, melhor colocado, entre os Quinze, do que a Grécia (39º) e a Itália (41º).

Os dados do relatório mostram, por exemplo, Portugal em antepenúltimo lugar (47º) na avaliação da qualidade da gestão empresarial (em que se inclui a avaliação da iniciativa empresarial, estratégia, atenção ao consumidor, controle de qualidade e métodos de gestão). Tudo factores essenciais ao crescimento da produtividade. Portugal surge, aliás, em 48º lugar na importância dada pelas empresas à formação dos trabalhadores, na investigação levada a cabo pelas indústrias-chave, na iniciativa empresarial e inovação e mesmo em último lugar no número de anos de escolaridade básica da mão-de-obra.

Igualmente preocupantes são as classificações obtidas em alguns factores-chave como a qualidade da organização do trabalho (36°), experiência internacional dos empresários (42°), qualidade da classe empresarial (40°), atenção concedida pêlos gestores ao mercado (45°), atenção dada à inovação, assumpção de riscos e esforço de inovação (46°), e volume de recursos dedicados ao desenvolvimento tecnológico (44°). Piores ainda parecem as classificações obtidas pelo país no que se refere à qualidade dos sistemas de distribuição (36°), qualidade da estrutura tecnológica (44°), uso de computadores (46°), qualidade do sistema educativo (38°) e sofisticação dos mercados financeiros (último lugar).

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Uma preocupação mundial

O drama do baixo crescimento da produtividade está, no entanto, longe de ser exclusivo do caso português. De facto, com a excepção de uma súbita descoberta de petróleo, os recursos naturais disponíveis numa economia não variam substancialmente. Por outro lado, o volume de mão-de-obra ou o de capital para investimento também quase sempre não variam, pelo menos drasticamente, de ano para ano. Apesar disso, a riqueza produzida nas economias tende a aumentar anualmente pelo simples efeito da melhor gestão dos recursos disponíveis.

Os economistas preocupam-se, por isso, em avaliar qual a fatia do crescimento económico que é directamente atribuível ao efeito "quantidade", ou seja, que fica a dever-se aos acréscimos registados no volume de emprego e investimento realizado, assim como qual a parte que se deve atribuir ao efeito "qualidade", isto é, que se explica por uma gestão mais eficiente dos recursos existentes. Conclui-se, aliás, que este segundo efeito é frequentemente o que maior impacto tem no próprio fenómeno do crescimento.

É a essas melhorias, resultantes da adopção de novos processos tecnológicos, da melhoria na gestão e organização dos processos produtivos, da formação e qualificação da mão-de-obra e dos ganhos de eficiência resultantes de políticas económicas mais adequadas (privatizações, desregulamentação, etc.), que se chama "ganhos de produtividade". O que os economistas não conseguem explicar é o porquê desses ganhos terem crescido ao longo dos últimos vinte anos de forma muito mais reduzida do que se verificara nas duas décadas anteriores, indiciando uma espécie de esgotamento na capacidade de ir gerindo de forma cada vez mais eficaz os recursos aplicados na economia. Um fenómeno no mínimo preocupante.

Na Europa, a produtividade global da economia (pelo menos no sector das empresas) cresceu, entre 1960 e 1973, a um ritmo anual de 3,3 por cento. Mas nos vinte anos seguintes, a média de crescimento caiu para menos de metade: 1,2 por cento. A redução atingiu, por igual, o trabalho e o capital cujas produtividades passaram, respectivamente, de 5,1 por cento para 2,1 por cento e de 0,7 por cento negativos para 1,6 por cento negativos. Em Portugal, a produtividade da mão-de-obra, na década de 60, crescera a um ritmo anual de 7,5 por cento.

Esta redução do ritmo de crescimento da produtividade não afectou apenas as economias europeias. Tratou-se de uma tendência mundial a que poucas economias conseguiram fugir e em que Portugal não foi excepção. No total da zona da OCDE, o crescimento da produtividade global na década de 60 foi ainda de 2,8 por cento, mas nas duas décadas seguintes o ritmo de crescimento reduziu-se para um quarto (0,7 por cento), enquanto nos Estados Unidos a queda foi ainda mais brusca: o crescimento da produtividade passou de 1,6 por cento de média anual, entre 1960 e 1973, para um oitavo (0,2 por cento) nas últimas duas décadas.

Estas quebras na evolução da produtividade justificam, em boa parte, o próprio fenómeno de abrandamento do crescimento das economias ocidentais. Na zona da OCDE a produção no sector das empresas aumentou, na década de 60, a ritmos anuais de 5,4 por cento. Mas, nos anos seguintes, já não foi além de um crescimento de 2,8 por cento, em média anual. Nos Estados Unidos, a produção que crescia a 3,8 por cento ao ano passou a crescer a 2,4 por cento no período de 1973 a 1993.

 

"Externo-dependentes"

No que se refere à economia portuguesa, quer em matéria de produtividade quer em matéria de crescimento da produção, desde a década de 60 que o padrão de evolução não se afasta do seguido pela conjuntura externa, ampliando apenas as respectivas oscilações. Se a produtividade (e o crescimento) está em alta na Europa, sobe em Portugal mais do que a média, como aconteceu na década de 60 e nos primeiros anos da década de 70 (antes do primeiro choque petrolífero); se está em baixa no exterior, em Portugal entra igualmente em queda e com frequência reduz-se de forma ainda mais acentuada, ampliando a onda registada no exterior.

Foi isso que aconteceu na década de 60 e se repetiu a partir de 1973 e até à actualidade. Mais uma vez, o estudo elaborado por Silva Lopes sobre o processo de crescimento económico português — integrado na obra "A Situação Social em Portugal 1960-1995" — prova-o à exaustão. Os cálculos elaborados por este economista (apesar de todas as limitações impostas pela má qualidade das estatísticas disponíveis) apontam para um crescimento da produtividade global — no sector das empresas — da ordem dos cinco por cento entre 1960 e 1973 (2,7 pontos percentuais acima da média), para se situar em escassos 0,6 por cento nos vinte anos seguintes (metade do valor registado na Europa).

O pior é que, no futuro, as expectativas não são mais animadoras. Em qualquer dos três cenários de evolução estrutural da economia portuguesa para o período de 1995 a 2015, traçados pelo Departamento de Prospectiva e Planeamento do Ministério do Planeamento, a evolução prevista para a produtividade para os próximos 20 anos está longe de ser brilhante. No cenário mais pessimista — a previsão de um crescimento económico de 2,2 por cento em média anual entre 1995 e 2015 contra um crescimento médio na Europa de dois por cento — admite-se um crescimento da produtividade global de 0,9 por cento (compatível com uma quebra da produtividade do capital de 0,5 por cento).

No cenário moderado (em que a previsão de crescimento económico médio anual já é de 3,3 por cento contra apenas 2,6 por cento em média nos Quinze) a previsão é pouco melhor: um aumento da produtividade global de 1,4 por cento, acompanhada de uma quebra da produtividade do capital de menos 0,3 por cento. E mesmo no cenário mais optimista (crescimento de 3,7 por cento contra 2,9 por cento na União), a estimativa de aumento médio anual da produtividade não vai além dos 1,6 por cento, compatíveis com a estagnação da produtividade do capital. Resumindo: aposta-se apenas numa moderada melhoria da produtividade da mão-de-obra.

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* Graça Franco

Jornalista do PÚBLICO.

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