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Janus 2001



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Ligações externas do movimento operário português

João Madeira*

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Os oito anos que separam a constituição da Associação Internacional dos Trabalhadores, em Londres, da criação da sua secção portuguesa, em 1872, reflectem a débil difusão das ideias socialistas em Portugal, ligada a um movimento sindical embrionário e a um proletariado inexpressivo. Antes, é possível apenas rastrear a influência de socialistas utópicos, como Lamennais, Fourier ou Proudhon, num movimento associativo baseado em caixas de solidariedade, associações de socorros mútuos, cooperativas ou, ainda, no pensamento de um escasso escol de intelectuais.

 

Portugal e a primeira Internacional

Contudo, são os acontecimentos revolucionários de 1868 em Espanha e a Comuna de Paris em 1871 que aceleram o acolhimento da AIT em Portugal. É particularmente por influência da secção espanhola da Internacional que se vai organizar a congénere portuguesa. Aos apelos e proclamações seguiu-se a forçada presença de membros do Conselho Federal espanhol da AIT em Lisboa no Verão de 1871, que vão impulsionar a organização da secção portuguesa, cujo pedido de adesão data de Março de 1872.

Todavia, no seio da Primeira Internacional trava-se já a grande polémica entre "marxistas" e "bakuninistas", que ditará num prazo curto o seu definhamento e ocaso. Quando Paul Lafargue, genro de Marx, chega a Lisboa no Verão de 1872, como delegado da Internacional, o seu objectivo é conseguir o apoio da secção nacional no contexto desses conflitos, que tinham, também aqui, a sua expressão. E se a importância da secção portuguesa era em si modesta, já o seu posicionamento a favor do Conselho Geral podia ganhar um maior peso, particularmente quando a secção espanhola era sacudida por lutas tempestuosas.

É justamente nesta altura que a secção portuguesa se aproxima dos "marxistas", defendendo uma AIT centralizada em torno do seu Conselho Geral. A participação portuguesa no congresso da AIT em Haia (Setembro de 1872), indirectamente representada por Lafargue que dispunha de mandato imperativo, reforça a importância da respectiva secção nacional num contexto de triunfo das posições "marxistas", mas também de irremediável cisão. Por outro lado, o fulgurante desenvolvimento e implantação da Associação Fraternidade Operária, a partir de 1872, revelando capacidade de enquadramento dos movimentos grevistas e de resistência, não poderá ser atribuído à acção concertada da secção da AIT, mas sim ao esforço de alguns dos seus aderentes.

A agonia da AIT nos anos de 1873 a 1876 é acompanhada pelo afrouxamento dos laços entre a secção portuguesa e o Conselho Geral, por um lado, mas também de crise da própria Fraternidade Operária, assim como da criação da Associação dos Trabalhadores da Região Portuguesa, que, com alguns sobressaltos, evoluirá para a criação, em Janeiro de 1875, do Partido Operário Socialista.

A actividade deste Partido Socialista faz-se em oposição aos agrupamentos republicanos, embora a sua expressão seja sempre tímida e débil, acompanhando sem grande fulgor a transição do constitucionalismo monárquico para a República, como que acabrunhado pela implantação de um regime que julgava desnecessário para a concretização da sua política reformista. A sua adesão à nova Internacional, a Segunda, que fora fundada em Londres, em 1889, far-se-á tardiamente, em 1913, isto é, já em pleno período de clivagem do partido republicano e em fase de consumação irremediável do divórcio entre a República e os trabalhadores, mas isso não significará uma maior influência do Partido Socialista no movimento operário.

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O movimento anarquista

No vazio deixado pelo republicanismo e principalmente pelo socialismo reformista na área da intervenção social, ascendem as correntes libertárias, procurando reagrupar o movimento operário português e reassumindo a herança "anti-autoritária" ou "bakuninista" presente na ATT. Trata-se de um esforço patente desde os anos 80 do século XIX, particularmente animado pela visita a Lisboa de Elisée Reclus. Porém, o impacte da primeira guerra mundial dilacerará, num plano internacional, quer o movimento socialista quer o anarquista, entre correntes guerristas e antiguerristas, com viva expressão também em Portugal, pela forma acutilante como era questionada a tradição anti-militarista do movimento operário internacional.

A importante imprensa anarquista portuguesa, por exemplo, acentua os seus alinhamentos internacionais em função desta profunda clivagem. Assim, pelos guerristas ou "aliadófilos" o seu porta-voz é a revista Germinal em contacto estreito com a imprensa internacional afim – La Bataille Syndicaliste, de Paris; AcciónLibertaria de Gijón ou La Libre Fédération, de Lausanne. Por seu turno, pelo lado antiguerrista, o jornal A Aurora alinha com Tierra y Libertad, de Barcelona, que organiza o Congresso Internacional Pró-Paz, em Ferrol (1915), onde participa uma importante delegação portuguesa, representando a União Operária Nacional e as Juventudes Sindicalistas. Desta enorme querela, reforçada com o triunfo da revolução russa em 1917, resultará, por outro lado, a cisão da Segunda Internacional, dando origem à Terceira – o Komintern (Moscovo, Março de 1919).

 

A hegemonia do partido comunista

Porém, no caso de Portugal, dada a inexpressividade do Partido Socialista, num quadro de excitação e simpatia dos anarquistas para com a revolução bolchevique, influenciados pêlos seus congéneres franceses, esta fractura processa-se por via da radicalização de alguns destes núcleos que, pretendendo ultrapassar os limites da acção sindical, se constituem inicialmente como Federação Maximalista (1919), para desembocarem no Partido Comunista Português, fundado em 1921, a que aderem largos sectores das Juventudes Sindicalista e Socialista.

As relações internacionais do movimento anarquista são muito menos estruturadas que as do Partido Comunista nascente em relação ao Komintern, mas os diferentes alinhamentos estão subjacentes à intensa polémica que é travada ao longo dos anos 20, em torno, por exemplo, da questão sindical, polarizando-se entre a adesão da CGT à Internacional Sindical Vermelha, como sustentava o PCP, ou a adesão à recém-reconstruída Associação Internacional dos Trabalhadores, em Berlim, como aprovara por esmagadora maioria o Congresso Operário da Covilhã, de 1922.

A acção dos militantes comunistas, sistematizada no I Congresso do PCP (1923), que contou com a presença de um delegado do Komintern – Jules Humbert-Droz – era no sentido de acumular forças no interior da CGT, constituindo núcleos sindicais partidários da ISV, embriões de uma nova organização sindical nacional alinhada com Moscovo. Era a consumação da cisão sindical, independentemente da sua amplitude.

A ditadura militar e o Estado Novo confirmarão uma tendência de declínio do movimento anarquista, mas será a derrota republicana na Guerra Civil de Espanha que lhe desfechará um golpe decisivo. No país vizinho, haviam constituído a Federação dos Anarquistas Portugueses Exilados, com relações, por sua vez, como a França, Argentina, Brasil ou EUA; participaram regularmente na Federação Anarquista Ibérica (fundada em 1927), desencadearam acções armadas quer na retaguarda, em Portugal, quer na frente interna espanhola. A derrota provocará um amargo profundo de que o movimento anarquista não conseguirá recuperar. O movimento operário passará a ser hegemonizado pelo Partido Comunista, numa fidelidade constante à União Soviética, sem qualquer oposição ou rivalidade significativa que viesse do seu seio.

Com o 25 de Abril e no período revolucionário, a crescente tutela do PCP sobre o movimento operário, através da acção sectarizada da Intersindical e com a questão da unicidade sindical, levará o Partido Socialista, em ligação à Internacional Socialista e às fundações adjacentes, a encabeçar a cisão sindical através do movimento Carta Aberta, que se tornará em União Geral dos Trabalhadores.

Carácter serôdio nas suas origens, mas sobretudo periférico e precário são as tonalidades que melhor se parecem adequar a mais de um século de ligações externas do movimento operário português. Todavia, nas grandes polémicas, as principais correntes do movimento operário português reflectiram sempre, inevitavelmente, os seus alinhamentos internacionais que, de forma mais ou menos aguda, intervieram e perturbaram os equilíbrios e as dinâmicas sociais e políticasdecorrentes da realidade nacional.

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* João Madeira

Mestre em História do Século XX pela FCSH da Universidade Nova de Lisboa.

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