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- JANUS 2003 -

Janus 2003



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Os Estados Unidos e o conflito israelo-árabe

Paula Pereira *

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Desde a presidência de Harry Truman que os EUA têm apoiado incondicionalmente o Estado de Israel. A ajuda militar assume especial destaque desde que John F.Kennedy decidiu vender mísseis Hawk a Israel, contrariando a opção do seu antecessor sobre a venda simultânea de armas a Israel e aos países árabes; Lyndon Johnson duplica a ajuda militar e opta pela venda de armas ofensivas a este país. A administração Clinton foi a que esteve mais próxima da resolução, pelo menos parcial, do conflito, enquanto George W.Bush não dá sinais de querer imiscuir-se nas negociações de paz entre os dois países.

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Desde a criação de Israel, em 1948 os Estados Unidos têm-lhe assegurado um apoio incondicional, tanto ao nível económico como militar. Tem assim interesse podermos seguir a evolução da política americana ao longo dos anos para o conflito israelo-árabe.

 

De Truman a Bush

O presidente Truman tomou a decisão de apoiar o Estado de Israel apesar das opiniões contrárias dos seus conselheiros que temiam uma reacção negativa dos países árabes contra os Estados Unidos, que poderia pôr em causa os seus interesses na região, nomeadamente petrolíferos.

No entanto, Truman optou por manter um equilíbrio de forças no Médio Oriente, tendo acordado com a Europa um embargo à venda de armas tanto aos países árabes como a Israel.

Kennedy veio modificar esse equilíbrio decidindo em 1962 vender a Israel mísseis Hawk. Começa assim uma relação estratégica entre os dois Estados. Esta decisão vai ao longo do tempo levar os Estados Unidos a manter um forte poder israelita na região e a adiar a resolução do conflito israelo-árabe.

Com Lyndon B. Johnson a política dos Estados Unidos foi claramente favorável aos isrealitas. Enquanto a ajuda militar duplicou entre 1948 e 1965, os Estados Unidos passaram a vender armas defensivas altamente sofisticadas em vez das armas defensivas até ali vendidas a Israel.

De 1962 a 1965 a ajuda militar americana passou de 12,9 milhões de dólares para 90 milhões de dólares: em 1948 esta ajuda era de 43 milhões de dólares(1).

Esta política teve por consequência uma grave deterioração das relações entre os Estados Unidos e os países árabes, em particular o Egipto.

Com o conflito de 1967, para o qual Israel conseguiu um acordo tácito dos Estados Unidos, este reforçou a sua presença e poder na região. Este conflito foi vantajoso para os Estados Unidos neste aspecto.

Durante a administração Nixon a política americana manteve o seu apoio económico e militar a Israel. Embora o secretário de Estado William Rogers tenha optado por uma política que favorecia o equilíbrio das forças no Médio Oriente, a política americana regressou ao apoio incondicional a Israel com o afastamento de Rogers e a sua substituição por Henry Kissinger. Para Kissinger, a União Soviética apoiava os palestinianos e era uma possibilidade de extensão do comunismo na área.

O secretário de Estado justificava assim o apoio a Israel no sentido de travar uma possível aquisição de poder da União Soviética na região.

O presidente Carter esforçou-se por voltar a uma política de equilíbrio de forças no Médio Oriente. O seu objectivo era instaurar a paz na região. Assim, Carter iniciou um diálogo com a União Soviética, que ele considerava, ao contrário de Kissinger, ser aliada para a resolução do conflito israelo-árabe.

A administração Carter empenhou-se em retomar a Conferência de Genebra que tinha sido boicotada por Kissinger. Carter integrou os russos neste esforço, conseguindo um comunicado conjunto como base para a reabertura da Conferência. Os Estados Unidos reconhecem neste comunicado os “direitos legítimos” dos palestinianos.

No entanto, Carter vai ser confrontado rapidamente não só com o lobby judaico nos Estados Unidos como com o próprio governo israelita liderado pelo primeiro-ministro Menachem Begin, do Likud. Este último, para contrariar a política de Carter, intensifica a repressão sobre os palestinianos e a construção de colonatos nos territórios ocupados. Carter iniciou então as negociações entre Israel e o Egipto que se concluíram com a assinatura dos acordos de Camp David que previam uma certa autonomia aos palestinianos, mas Israel, a Jordânia e o Egipto ficaram com a responsabilidade de definir um estatuto final para os territórios.

A política de Reagan foi claramente favorável a Israel e com opiniões nitidamente negativas em relação aos palestinianos e à OLP (Organização de Libertação da Palestina). Voltou-se a uma política muito próxima da de Henry Kissinger. Os Estados Unidos consentiram e apoiaram a invasão do Líbano.

A administração Reagan apresentou no entanto um plano de paz, mas este não foi aceite nem pelos árabes nem pelos israelitas. Foi apresentado mais um plano durante a administração Reagan, em 1988, pelo secretário de Estado George Shultz, mas também não foi aceite por não contemplar certos aspectos que apareciam em planos anteriores como o princípio de “território em troca da paz”.

A administração Bush, com o secretário de Estado James Baker, empenhou-se, desde o início do seu mandato em reunir as partes envolvidas com vista a uma resolução do conflito. As relações da administração americana com o primeiro-ministro israelita Yitzhak Shamir não eram boas e apesar da pressão do lobby judaico o objectivo de Bush era conseguir que Israel aceitasse as reivindicações dos palestinianos.

A guerra do Golfo em 1991 permitiu reunir as partes em Madrid. No entanto, as negociações que se seguiram à Conferência de Madrid não trouxeram evoluções positivas na região até ao final do mandato de George Bush.

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De Clinton a Bush

A administração Clinton foi a que esteve, até hoje, mais perto de conseguir uma resolução, pelo menos parcial, do conflito israelo-árabe. Por outro lado, o contexto geralnunca tinha sido tão favorável a negociações. De facto, a paz já estava consolidadaentre Israel e o Egipto, o nacionalismo árabe, representado por Saddam Hussein tinha caído em descrédito e as eleições em Israel tinham trazido ao poder uma ala mais moderada na pessoa de Yitzhak Rabin.

Depois da conferência de Madrid as negociações israelo-palestinianas foram mediadas pelo ministro dos Negócios Estrangeiros da Noruega, Johann Holst, sem participação americana. Os Estados Unidos, por seu lado, tentavam chegar a um acordo israelo-sírio, numa primeira fase para poderem também resolver o conflito israelo-libanês, interligado ao interior, pelo poder que a Síria mantinha e mantém sobre o Líbano. A outra questão a resolver, identificada em Madrid, era a Jordânia. Contudo, os jordanos não estavam dispostos a avançar para um acordo de paz com Israel sem ser primeiro resolvido o conflito israelo-palestiniano.

As negociações entre Israel e a OLP iriam acabar com os acordos de Oslo, assinados em Washington a 13 de Setembro de 1993. Foi assim possível concluir um acordo de paz entre a Jordânia e Israel, assinado a 26 de Outubro de 1994 na presença de William Clinton.

As negociações entre Israel e a Síria ficaram paradas sem terem chegado a acordo. Shimon Peres tentaria relançá-las após a morte de Rabin mas sem sucesso.O acordo Oslo II, sobre uma retirada suplementar da Cisjordânia, foi então assinado a 28 de Setembro de 1995.

No fim do seu mandato, Clinton tentou relançar as negociações em Camp David mas as partes não chegaram a acordo.

A segunda Intifada, que teve início em Setembro 2000, e a eleição de Ariel Sharon para primeiro-ministro de Israel demonstram uma radicalização das posições das duas partes e inviabilizam os acordos assinados até à data.

O novo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, não mostra sinais de querer implicar-se em negociações de paz entre Israel e a OLP, embora tenha pedido a elaboração do plano Mitchell, que foi recusado por ambas as partes.

Na sua declaração de 24 de Junho de 2002, Bush reconhece a Israel o seu direito de defesa e apela a eleições na Cisjordânia e Faixa de Gaza. Para Bush, Yasser Arafat está ligado às redes terroristas, pelo que subordina as negociações para um acordo de paz à demissão de Arafat.

 

Os grupos de pressão pró-israelitas

A política americana em relação ao conflito israelo-árabe tem sido influenciada ao longo dos tempos por um grupo de pressão, o lobby judaico.

O presidente Truman já referia nas suas Memórias o papel dessas “pressões sobre a Casa Branca”.

A importância da comunidade judaica nos Estados Unidos, devido à imigração em massa desta população depois da vaga de perseguições do fim do século XIX e do início do século XX confere-lhe um peso significativo: 5,8 milhões de pessoas, ou seja 30 % mais do que em Israel. Esta minoria dispõe desde logo de uma influência eleitoral que não convém negligenciar, em particular nos Estados onde está concentrada: representa 3% da população da Califórnia e do Connecticut, perto de 4% na Pennsylvania e no Massachusetts, mais de 4% no Estado do Maryland, mais de 5% em New Jersey e 14% no Estado de New York. Para além disso, a participação desta comunidade nas eleições é em geral muito mais elevada que a média dos seus concidadãos, assim, os judeus americanos representam mais do que o seu número real. Também, esta presença, significativa só por si, parece duplicada pela disciplina de voto desta população, o que faz a sua força. Os judeus americanos são representados por várias organizações de carácter religioso.

A Conferência dos presidentes das principais organizações judaicas tem um papel activo, nomeadamente em relação à Casa Branca e ao Departamento de Estado. Contam-se também o Conselho sionista americano, o B’nai Brith, ou ainda, a famosa Liga de Defesa Judaica, fundada pelo rabino Meïr Kahane. Cada um dos grandes partidos israelitas tem uma “representação” nos Estados Unidos, em particular a direita, que se apoia sobre a organização sionista da América.

Mas é a American Israel Public Affairs Committee (AIPAC) (Comité americano-israelita de Negócios Públicos), que desde 1954 coordena oficialmente a intervenção do grupo de pressão. Conta com 50.000 membros, dos quais 58 permanentes no Capitólio. Em 1995 o seu orçamento anual ultrapassou os 15 milhões de dólares, repartidos, via vários Political Action Committee (PAC), aos políticos americanos, em função das suas tomadas de posição em relação a Israel e aos conflitos do Médio Oriente. No total, perto de 50 membros do Senado e cerca de 200 da Câmara de Representantes estão sob influência directa do grupo de pressão judaico. Aliás, o escritor israelita Uri Avnery afirma que “resistir às directivas do lobby judaico equivale a um suicídio político”(2).

Os judeus americanos contribuem em 60% para as campanhas eleitorais do Partido Democrata, e em 40% para as do Partido Republicano. Tradicionalmente, votam a 70% para os democratas e a 30% para os republicanos. Com uma excepção no entanto, o republicano Ronald Reagan que beneficiou, em 1980, de 40% dos votos deste eleitorado, seduzido pela posição pró-israelita de Reagan.

O democrata Bill Clinton, do qual se descreveu a ligação com Israel como sendo quase religiosa, bateu um recorde em 1992, obtendo segundo os analistas, 85% dos votos dos seus concidadãos judeus. Na verdade, Clinton opunha-se a George Bush que tinha ousado, falando do lobby judaico, denunciar “grupos muito fortes e muito eficazes que estão contra nós”...

A potência do grupo de pressão pró-israelita beneficia também com a fraqueza do lobby pró-árabe, apesar da criação recente da Associação Nacional dos Árabes Americanos e do Comité americano-árabe contra a discriminação. Mas só 100.000 dos 2.500.000 americanos de origem árabe participam nestas organizações, contra 2.000.000 de judeus americanos que são activos numa comunidade de 5.800.000. Por outro lado, enquanto a embaixada de Israel nos Estados Unidos mantém laços estreitos com este grupo, nenhuma das embaixadas árabes age da mesma forma com as organizações pró-árabes.

Contudo, esta força não impede crises no seio da comunidade pró-israelita.

Por exemplo, a guerra do Líbano e a Intifada Palestiniana tiveram como consequências grandes divergências dentro da comunidade. Segundo as sondagens, metade dos seus membros condenam a atitude do governo israelita e 70% pronunciam-se por uma solução negociada. Os acordos de Oslo trazem aos judeus americanos uma esperança, com certeza misturada com preocupações, mas maioritária: dois terços da comunidade apoiam as negociações de paz (contra menos de 10%) e esperam que as organizações judaicas contribuirão para a sua implementação.

Em 1996, perto de dois terços dos judeus americanos eram favoráveis à criação de um Estado palestiniano.

No entanto, depois do atentado do 11 de Setembro, a posição da comunidade judaica pode ter mudado. Beneficiam agora também de um apoio mais visível por parte da Comunidade Cristã, em particular dos Protestantes Evangélicos mas também da Igreja Católica, entre outras organizações. Estima-se que esta comunidade seja constituída por 40 milhões de cristãos conservadores, que podem ter uma influência sem precedentes a favor de Israel.

Neste últimos anos, surgiram vários grupos de Cristãos conservadores que contam também com o apoio de vários homens políticos. A Cornestone Church do Texas, por exemplo, tem 5.000 membros que dão apoio à causa israelita, inclusive, formando alianças com organizações judaicas. Esta nova organização detém também o programa de rádio judeu mais importante e o animador apela constantemente o seus ouvintes a trabalhar para apoiar Israel.

Assim, a pressão dos grupos pró-israelitas sobre a Casa Branca e o Congresso é considerável e a afirmação de Uri Avnery torna-se uma realidade para toda a classe política americana.

__________
1 Maria do Céu Ferreira Pinto, “A política americana no Médio Oriente”, in Nação e Defesa , Instituto da Defesa Nacional, nº82, Abril-Junho 1997, p 7-35.
2 Uri Avnery, Deux âmes, 12 de Junho de 2002, http://www.terredescale.net.

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* Paula Pereira

Mestre em Estratégia Militar e Políticas de Defesa, Relações internacionais. Assessora do Director do Instituto da Defesa Nacional.

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Bibliografia

Maria do Céu Ferreira Pinto, “A política americana no Médio Oriente”, in Nação e Defesa, Instituto da Defesa Nacional, nº82, Abril-Junho 1997, Lisboa.

William B. Quandt, “Clinton le facilitateur”, in La Revue Internationale et Stratégique, Moyen-Orient: Transitions, nº40, Hivre 2000-2001, Paris.

Staregic survey, The International Institute for Strategic Studies, 2000-2001, London.

Le Monde Diplomatique, Proche Orient, La Déchirure, Paris.

Declaração de George W. Bush de 24 de Junho de 2002.

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