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Como (não) nos chega a informação sobre a Europa

Teresa Maia e Carmo *

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Se quiser ligar para a União Europeia (UE), qual é o nº de telefone? Dúzias. Depende. A que Europa se refere? A que vem de Constantino, passando por Carlos Magno, ou a que envolveu o mundo em duas guerras sangrentas no último século, ou mesmo o modelo de valores sociais de democracia e pluralismo que se tornou num gigante económico, com450 milhões de pessoas e um quarto do produto interno mundial? Quer falar com a Comissão, o Conselho, o Parlamento ou...?

Para um cidadão europeu comum, descortinar estas diferenças é difícil, como mostram todos os eurobarómetros. Sabe-se que é qualquer coisa que existe, em princípio para o nosso bem, e move-se. Não se sabe bem para onde, mas move-se. O já muito falado défice democrático europeu é acima de tudo um défice de comunicação. Pensemos nos três elementos estruturantes desta equação: a política mediática da UE, a relação dos media com os assuntos europeus e as singularidades do caso português.

Comecemos pela forma como a UE comunica com os cidadãos e os jornalistas. Para os primeiros, a comunidade dispõe de “pontos de contacto” em todos os Estados-membros que fornecem informação directamente ao cidadão que ali se desloque, assim como o portal EUROPA na Internet, nas 20 línguas existentes desde o alargamento. O que representou um esforço digno de nota, sublinhe-se. No entanto, uma viagem ao infinito universo virtual da União deixa rapidamente à vista os dois principais problemas de que padece a sua política de comunicação: excesso de informação e (enorme) falta de clareza na sua apresentação. Basta ver o tamanho das listas de endereços que a documentação oficial exibe para adivinhar o calvário de quem se atreva a querer efectivamente comunicar.

Repare-se, ainda, na duplicação de “centros de informação” comunitários e nacionais, estes espalhados pelos vários ministérios, cada um com a sua avulsa designação (desde gabinetes de assuntos europeus, a direcções várias de relações internacionais), ou ainda, a falta de harmonização dos endereços electrónicos (URL’s) dos simples infopoints espalhados pelo país. O uso de URL’s complexos, um dos mais elementares erros a evitar nas boas práticas de produção de conteúdos para a web, tem a sua pièce de resistance na irónica morada de acesso aos documentos do Conselho: “http://eu.ue.int/pt/summ.htm, rubrica Transparência”! Em termos de comunicação com o cidadão este é o primeiro paradoxo: se tudo funciona tão bem por que é que a informação não chega às pessoas?

 

A Europa não se vende

A resposta leva-nos ao segundo aspecto da equação acima enunciada. Henrique Monteiro, subdirector do Expresso, resume assim: “Os portugueses ligam pouco aos media. Os media ligam pouco à Europa e, no conjunto, os portugueses não ligam quase nada aos assuntos europeus”. Primeiro: está criada a ideia de que o assunto é “chato”, difícil, complexo e não vende. Dá notícias sem alma ou polémica, ao contrário daquelas que o sistema comunicacional português se habituou a privilegiar, condicionado por uma alfabetização tardia e níveis de literacia precários que resultaram em índices de leitura baixíssimos, nomeadamente de jornais e numa clara hegemonia da televisão como meio de informação privilegiado. Mas que nivelou por baixo toda a informação, incrementando telejornais com doses maciças de crime, escândalos e futebol, chegando ao absurdo de passarem oito (oito!) anos sem programas de debate no prime-time de todas as televisões portuguesas. A tendência alastrou aos jornais, mesmo os chamados “de referência”. Ou seja, quem passou a definir alinhamentos e prioridades noticiosas foi essa entidade abstracta chamada “público”. Todas as teorias do gatekeeping ou agenda setting mostraram à exaustão a importância da agenda mediática como construção social da realidade. Mas, tendo deixado de ser as elites a decidir o que se publica, como sair deste ciclo vicioso do “dar ao público o que ele quer”?

Desembocamos aqui em todas as teses sobre a responsabilidade social dos media, actualíssimas de resto, mas ineficazes quanto a uma leitura realista do que se passa. O que se passa é que a informação e a comunicação são mercados. Jornais, rádios e televisões são bens privados e não escolas ou instituições de solidariedade social. Donde, têm forçosamente de gerar lucros pois disso depende a sua sobrevivência. No entanto, esta que deveria ser uma preocupação exclusiva dos administradores de empresas de media, deslocou-se perversamente para o coração da própria actividade jornalística, gerando uma auto censura prévia relativa a determinados assuntos, criando uma espécie de bolsa de “proibidos”, como os temas europeus. A isto acresce uma tradição de leitura quase exclusivamente económica da integração europeia.

Os primeiros correspondentes em Bruxelas e, nas redacções, os responsáveis pela sua cobertura eram jornalistas da área económica, pois foram também esses os primeiros caminhos trilhados pela União – que começou por ser CEE. Ela surge sempre como uma questão de défice, políticas de convergência financeiras, subsídios e pouco mais. Este vício de leitura conduziu, por outro lado, a uma estanhada ignorância dos assuntos europeus por parte dos jornalistas. João Ferreira, coordenador das manhãs da SIC Notícias e responsável pelo (notável) Euro-Respostas, uma co-produção SIC-UAL, é peremptório: “90% da minha redacção não sabe quem são os 24 eurodeputados portugueses e não faz a mínima ideia de como funciona a UE”. Ora, se é certo que os media não são vocacionados para ensinar, não é menos correcto que devem... aprender. Só assim servirão como descodificadores da realidade que é – sempre – complexa e multifacetada.

Graça Franco, sub directora da Rádio Renascença, apontou um exemplo lapidar: esteve anos sem perceber o exótico caudal informativo acerca do tamanho das jaulas para transporte de galinhas na União. Até ao surto das toxinas em frangos ter

assolado a Bélgica, alastrando rapidamente a outros países. Ou seja, os complexos processos de negociação no seio das instituições europeias têm mesmo de ser descodificados. Se tivermos em conta que, actualmente, 80% dos ordenamentos jurídicos nacionais provêm de instituições comunitárias, torna-se crucial saber como são tomadas tais decisões que, de facto, afectam a vida concreta dos cidadãos. Segurança alimentar, juros de habitação, emprego e circulação do conhecimento não são temas menores. E os media portugueses, sempre tão pressurosamente críticos em relação aos processos de decisão nacionais, são de uma complacência quase inocente em relação aos mesmos a nível europeu.

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Portugueses gostam mas não sabem de quê

Por fim, a relação dos portugueses com a Europa apresenta traços de quase esquizofrenia. Os últimos eurobarómetros feitos antes das eleições de 13 de Junho (altura em que este texto é escrito), além de apontarem para uma alarmante abstenção, na casa dos 70%, indicam uma adesão afectiva e instrumental (têm mais confiança nas instituições europeias que nas nacionais e percebem a importância dos fundos estruturais), em paralelo com um quase total desconhecimento das realidades europeias. O facto de expressarmos opiniões absolutamente desqualifi cadas sobre o assunto prende-se, talvez, com o histórico da adesão. Foi desde o início uma decisão política que, visionariamente, se antecipou às necessidades dos cidadãos.

Ou seja, nunca partiu de uma vontade popular (Portugal foi dos raros países que não referendou a sua adesão), numa sociedade já de si com índices de participação cívica diminutos. A leviandade da classe política, alternadamente no poder e na oposição, também não ajuda. As eleições para o Parlamento Europeu (PE) são sistematicamente transformadas em actos “de segunda”, servindo para se digladiarem sobretudo políticas nacionais, apelando ao voto castigador interno, como se viu nesta campanha, “futebolizada” até ao mais baixo nível de argumentação. Perdem-se, assim, oportunidades únicas para efectivo esclarecimento das populações.

O problema está, contudo, longe de ser exclusivamente português. Este alheamento é geral, como demonstram os dados oficiais, que registam uma evolução permanentemente negativa. Os índices de participação em 1979 eram de 66% e vieram sempre a descer até 1999, quando não atingiram sequer os 50% na generalidade dos Estados. O primeiro absurdo destes resultados é o facto de, por um lado, a participação descer tanto mais quanto mais aumentam as competências do PE e, por outro, a intenção de voto antes de eleições ser sempre superior à sua concretização (15 a 2%). No ponto crucial da construção em que nos encontramos, a deficiente política de comunicação europeia deverá ser uma prioridade, pois povos desinformados não só não contribuem para uma Europa democrática, como podem pô-la em perigo.

Há tentativas? Decerto que sim, meritórias mas infelizmente ainda casuísticas. Refiram-se as iniciativas da representação do PE em Portugal como as parcerias com jornais (“Fichas DN”, os “Guias do Expresso”, a excelente banda desenhada “Águas Perigosas” com o JN), rádios (módulos sobre cidadania europeia desmultiplicados por rádios locais), televisões (“Mais Europa” na RTP, “Euro-respostas” na SIC Notícias) e acções de divulgação conjuntas com o Centro Jacques Delors e a Comissão Nacional de Eleições. A construção da identidade é um processo mutável e em permanente negociação. Dada a diversidade da sua configuração e a importância geoestratégica deste bloco no mundo, ou existe uma vontade política forte de mobilizar para os valores que o projecto europeu representa, ou a breve trecho poderemos deparar com surpresas desagradáveis. Actualmente o que une os cidadãos europeus? Apenas uma moeda e um punhado

de funcionários. Estão a negligenciar-se factores como a educação e os próprios media. Injectar nos curricula escolares uma europeidade convicta, no sentido de as crianças crescerem a saberem ser portuguesas e europeias, sem confl itos. Estimular a criação de lobbies europeus nas redacções, através da formação específica de jornalistas. Apostar em canais abertos de televisão com expressão verdadeiramente europeia e capacidade de chegar a grandes massas (não é a Euronews...). Utilizar o poder mobilizador dos novos media e das tecnologias do digital. Lançar mão de um marketing actualizado que vá além da propaganda institucional. Enfim, colocar a Europa na moda e no coração dos cidadãos exige uma estratégia de comunicação clara e eficaz. Que não existe e é sobretudo uma questão de vontade política.

 

Informação Complementar

ORGANISMOS DE INFORMAÇÃO EUROPEIA (OIE) EM PORTUGAL

Centro de Informação Europeia Jacques Delors: www.cijdelors.pt

Centros de Informação Europeia (Info-Points):

• Braga: www.aiminho.pt
• Faro: www.ccr-alg.pt/europa/index.html
• Funchal: www.madinfo.pt/europa
• Lisboa: www.cgd.pt/informacao_financeira/mediateca
• Porto: www.cm-porto.pt
Fonte: Guia Expresso da União Europeia.

 

ORGANISMOS DE REPRESENTAÇÃO DA UE EM PORTUGAL

• Gabinete em Portugal do Parlamento Europeu. Largo Jean Monnet, 1 - 6º, 1269-070 Lisboa.

Telef: 213 504 900. Net: http://www.parleurop.pt

• Representação em Portugal da Comissão Europeia. Largo Jean Monnet, 1 - 10º, 1269-068 Lisboa.

Telef: 213 509 800. Net: http://euroinfo.ce.pt

• Banco Europeu de Investimentos – Delegação em Portugal. Regus Business Center, Av. da Liberdade, 110 - 2º, 1269-046 Lisboa. Telef: 213 428 989

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* Teresa Maia e Carmo

Licenciada em Comunicação Social pela Universidade Nova de Lisboa-FCSH. Mestre em Comunicação Educacional Multimédia pela Universidade Aberta. Doutoranda em Comunicação na Universidade Complutense de Madrid. Docente na UAL. Jornalista.

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