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A Europa moderna a Leste e as identidades políticas (I)

Fernando Amorim *

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Num contexto em que a União Europeia parece estar em condições históricas e políticas de construir uma identidade-projecto (Moita, 2004), de que o novo Tratado da União Europeia, a ser conduzido a bom termo, poderá constituir a expressão mais elevada, este artigo pretende realçar algumas especificidades do processo histórico que conduziu à “formatação” das identidades políticas europeias de que se consensualizou, de forma redutora, constituírem desde a Idade Moderna verdadeiros Estados-Nação.

 

Um continente anómalo

Em edição anterior desta publicação (v.g. Janus 2005: A Guerra e a Paz nos nossos dias), a propósito das dinâmicas culturais na Europa, o investigador e geógrafo João Ferrão chamava a atenção para que a Europa, como continente, é uma invenção dos Europeus (Ferrão, 2004:77-79) que, apenas paulatinamente foi ganhando uma dimensão de espaço geográfico, mas culturalmente diversificado, embora sujeito à força federadora do cristianismo. Sob a sua égide emergiu o sonho de unificar a Europa, um verdadeiro continente anómalo, sempre postergado pelo processo de fragmentação política resultante da formação dos Estados modernos. Mas será a invocação por estes dos valores da modernidade entendidos como o conjunto de profundas transformações culturais, políticas e técnicas que reanimará a ideia de uma delimitação formal da Europa como continente. Na mesma altura chamou-se também a atenção para que a ideia de uma Europa cultural constitui, na essência, um mito que se confronta com a complexidade de uma noção de identidade, com a polissemia da noção de cultura e com a multiplicidade, fluidez e diversidade da própria noção de Europa (Morin, 1988: 241 apud Amorim, 2004:85). E com efeito, a ideia da representação da Europa como comunidade imaginada, do Atlântico aos Urais, é uma artificialidade, que remonta aos séculos XVII-XVIII, não coincidente com qualquer delimitação de natureza político-administrativa, mas de evidente significado “místico” como território de modernidade. Enquanto continente de geometria variável, porquanto a Leste não possui uma fronteira natural e as que procuraram dar-lhe, os Urais ou o Bósforo, não são muito úteis politicamente, na medida em que não são nem nunca foram fronteiras de Estados (Amorim, 2004:84-85), os eventos políticos e militares ocorridos neste “espaço de modernidade” naqueles dois séculos assumem particular relevo na construção de afinidades histórico-culturais, leia-se nacionais, entre as comunidades humanas correspondentes aos estados ‘modernos' europeus do Antigo Regime. Essa relevância é particularmente evidente nas regiões ‘Euro-Continental', “Euro-Católica” e ‘Euro-Ortodoxa' (Mezei, 2000 apud Amorim, 2004:85).

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O Báltico, o apogeu da Suécia, a emergência da Prússia e o avanço da Rússia

É neste quadro que se deve reter a importância do Tratado de Oliva [Oliwa], localidade situada perto de Gdansk (Danzig) em 23-04-1660, à época território da Prússia Real, província do reino da Polónia desde 1466 e da Comunidade lituano-polaca de 1569 a 1772 (Stone, 2001). Os signatários foram o imperador do Sacro Império Romano-Germânico Leopoldo I de Habsburgo, Frederico Guilherme, eleitor de Brandeburgo-Prússia, o rei Carlos X da Suécia e João II Casimiro, rei da Polónia. Por este tratado, que punha termo, no quadro da luta pelo Báltico (Frost, 2000), às Guerras do Norte (1655-1661), entre a Suécia e os seus adversários, comunidade lituano-polaca (1655-1660), Rússia (1656-1661), Brandeburgo-Prússia (1657-1660) o Sacro Império Romano-Germânico (1657-60) e a Dinamarca-Noruega (1657-1660), o rei polaco renunciava às suas pretensões sob a coroa sueca (que o seu pai Sigismundo III Vasa perdera em 1599), cedia à Suécia a Livónia e a cidade de Riga, sob controle sueco desde 1620. Neste conflito em que a Suécia contou com a aliança da Inglaterra e os seus adversários com o apoio da República das Sete Províncias Unidas da Holanda, a casa Hohenzollern-Brandeburgo viu confirmado o estatuto independente e soberano, reconhecido no tratado de Wehlau (1657) do Ducado da Prússia (Prússia Oriental), com capital em Königsberga (hoje Kalininegrado) e que desde 1618 constituía domínio pessoal do príncipe eleitor do Margraviado de Brandeburgo integrado na coroa polaca. Até esta data a totalidade dos domínios de Brandeburgo situavam-se e constituíam parte do Sacro Império Romano-Germânico, na época sob domínio da casa de Habsburgo, com o imperador e rei dos Alemães Leopoldo I. Em contrapartida pela aliança contra a França na Guerra da Sucessão de Espanha o imperador aceitou que o eleitor de Brandeburgo passasse a utilizar o título de “rei na Prússia” (1701), nos seus territórios não imperiais, e não de “Rei da Prússia”, mas que reconhecia o estatuto de reino ao até então ducado (Lisk, 1967). Este título, que recolheu a aceitação geral das potências nos Tratados de Utreque (1713-1715) implicitamente reconhecia a soberania sobre toda a região da Prússia e não apenas sobre o Ducado com o mesmo nome, pondo em causa a integridade territorial da Polónia, porquanto a província da Prússia Real constituía parte do reino da Polónia, o que justificou aos seus reis a intitulação de “Reis da Prússia” até 1742. Contudo, ao longo do século XVIII o poder dos “Reis na Prússia” continuou a aumentar, vencendo a monarquia austríaca dos Habsburgo nas três guerras da Silésia (1740-42; 1744-45; 1756-63) que a tornaram território prussiano nos 150 anos seguintes. Em 1772 Frederico II “o Grande” adoptou o título de “Rei da Prússia”, na mesma altura em que anexou a quase totalidade da Prússia Real, excepto Gdansk (Danzig), na “primeira partilha da Polónia” (Friedrich, 2000). Embora o Tratado de Oliva seja mais conhecido por, em conjunto com o Tratado de Copenhaga (27-05-1660), marcar o apogeu territorial da Suécia imperial (embora não lograsse fechar o Báltico aos navios de guerra estrangeiros) e definir as actuais fronteiras da Dinamarca e da Noruega, a sua importância releva de constituir o ponto de partida para a emergência da Prússia como entidade política e futura potência continental. Já o Império da Suécia (Stormaktstiden), que emergira em 1611 e se afirmara na Paz de Vestefália (Osnabrück-Münster, 15-05 e 24-10-1648) como uma das grandes potências da Europa, após a morte de Carlos X entraria num rápido declínio que culminaria, pese embora a aliança com o Império Otomano, na sua queda como grande potência, na Grande Guerra do Norte (1700-21) que tornou a Rússia (Frost, 2000), após os tratados de Estocolmo e Nystad (1719-21), na grande vencedora e na potência dominante no mar Báltico e na política europeia (Schroeder, 1996), fruto de uma larga coligação que reuniu à Rússia a Dinamarca-Noruega, a Saxónia, a Comunidade Lituano-Polaca (desde 1701) e a Prússia e Hanôver (desde 1715). A partir de 1721, Pedro I “o Grande” passou a intitular-se “Czar de todas as Rússias”. A Rússia substitui-se à Suécia como grande potência do Báltico.

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* Fernando Amorim

Licenciado em História pela Universidade Autónoma de Lisboa. Mestre em História – História Moderna, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FL/UL). Docente da UAL. Investigador do Observatório de Relações Exteriores. Membro do Conselho Directivo do Observatório de Relações Exteriores. Editor do anuário Janus.

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Referências bibliográficas

MOITA, Luís (2004) – “A identidade europeia e a Constituição”. In Espaço Europeu de Informação e Comunicação. Lisboa: Universidade Autónoma. 23 de Março de 2004.

MEZEI, Balázs M. (2000) – The Enlargement of NATO: Cultural Lessons and Philosophical Perspectives: An Essay in Geocultural Philosophy. Budapest: Eötvös Loránd University of Budapest, Institute of Philosophy.

STONE, Daniel Z. (2001) – The Polish-Lithuanian State, 1386-1795, Vol. 4. Washington: University of Washington Press. ISBN-13: 9780295980935, p. 46

SCHROEDER, Paul W. (1996) – The Transformation of European Politics 1763–1848. Oxford University Press, ISBN 0-19-820654-2, p84

LISK, Jill (1967) – The Struggle for Supremacy in the Baltic: 1600-1725. New York: Funk & Wagnall's.

FROST, Robert I. (2000) – The Northern Wars, 1558-1721. Harlow: Longman, ISBN 0-582-06429-5

FRIEDRICH, Karin (2000) – The Other Prussia: Royal Prussia, Poland and Liberty, 1569-1772. Cambridge: Cambridge University Press, ISBN 0-521-58335-7

EVANS, Robert John Weston (1979) – The Making of the Hapsburg Monarchy, 1550-1700: An Interpretation. Oxford: Oxford University Press. ISBN 0198730853

LEÓN SANZ, Virgínia (2003) – Carlos VI: el emperador que no pudo ser rey de España. Madrid: Aguilar. ISBN 8403094094

BROWNING, Reed (1993) – The War of the Austrian Succession. New York: St Martin's Press, 1993 ISBN 0-312-09483-3, p.403-431.

JELAVICH, Barbara (1983) – History of the Balkans: Eighteenth and Nineteenth Centuries. Cambridge University Press, 1983. ISBN 0-521-25249-0.

McCARTHY, Justin (2001) – The Ottoman Peoples and the End of Empire. Hodder Arnold, 2001. ISBN 0-340-70657-0.

QUATAERT, Donald (2005) – The Ottoman Empire, 1700–1922. Cambridge University Press, 2005. ISBN 0-521-54782-2.

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Dados adicionais
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