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- JANUS 2009 -



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O fabuloso destino das economias emergentes

Henrique Morais *

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Nas próximas entradas deste Anuário irá traçar-se o perfil evolutivo de uma série de economias que se têm destacado pela sua significativa capacidade de crescimento económico nos últimos anos (ou décadas, nalguns casos).

Além dos países em análise se caracterizarem pela sua expressiva dimensão territorial e, na maioria dos casos, também populacional, um outro factor os une: todos eles fazem parte do que se convencionou chamar de economias emergentes , não porque deste grande grupo de países (segundo o Fundo Monetário Internacional serão 141 nações) se espere forçosamente grandes demonstrações de pujança económica, mas tão só porque não cumpriram os requisitos suficientes para integrarem o restrito grupo das chamadas economias avançadas – onde o FMI coloca apenas 31 estados.

Todavia, nos últimos anos, coexistiram vários fenómenos que permitiram às economias emergentes atingir ritmos de crescimento deveras expressivos, que as aproximaram, nalguns casos rapidamente, de padrões que apenas estávamos habituados a vislumbrar nas economias avançadas.

As próximas linhas tentam avaliar de que forma e a que ritmo se processou a aproximação entre os dois grandes grupos económicos enunciados, o que esperar para os próximos anos e como a evolução recente alterou o equilíbrio a nível da geoeconomia mundial.

 

Caracterização do fenómeno

O conjunto de gráficos que se apresenta em seguida descreve melhor do que quaisquer palavras a evolução do peso de cada uma das duas classes de economias descritas anteriormente.

Deste modo, o Produto Interno Bruto a preços correntes (dólares dos EUA) das economias avançadas representava, no início da década de 80 do século XX, cerca de 69% do total mundial, peso que aumentou progressivamente até aos 84%, evidenciados em 1992. A partir de então, assistiu-se a uma redução progressiva, quedando-se, em 2008, por 65% do total mundial.

Todavia, quando observamos os dados do PIB em paridade de poder de compra (1), a dinâmica das economias emergentes surge de forma mais significativa: em 1980, o PIB destas economias representava apenas 37% do total mundial, hoje atinge 50%, pelo que podemos concluir que metade do produto mundial é actualmente gerado no mundo emergente.

As dinâmicas regionais são igualmente curiosas: no início dos anos 80, a actual Comunidade de Estados Independentes (em que a Rússia tem um peso esmagador) era a região mais importante a nível das economias emergentes, logo seguida pelo Hemisfério Ocidental (que corresponde, em traços gerais, à América Latina e Caraíbas). A Ásia em desenvolvimento era apenas o 3.º grupo mais significativo e África o menos relevante. Ora, quase 30 anos depois, África mantém-se como o continente eternamente adiado mas a Ásia em desenvolvimento é agora, destacadamente, a região mais importante a nível das economias emergentes, representando cerca de 39% do PIB a preços correntes e 50% do PIB avaliado em paridade de poder de compra.

 

Dinâmicas intra-asiáticas

A emergência de um conjunto de novos actores asiáticos no contexto do comércio internacional começou por ser um primeiro sinal das alterações profundas que a economia mundial haveria de sofrer nesta mudança de século.

Tremendamente impulsionados pela globalização, tanto ao nível dos mercados e produtos, como da infraestrutura dos transportes e comunicações, primeiro a China e a Índia e, agora, economias como a Malásia, Tailândia, Indonésia e, a outra escala, Camboja e Vietname, começaram a ocupar um lugar de destaque na esfera económica internacional.

Este dinamismo da Ásia emergente é amplamente ilustrado pelo gráfico que apresenta o peso do Produto Interno Bruto a preços correntes (PIB) de algumas das suas principais economias em relação ao total mundial. Deste modo, entre 1990 e 2008, o PIB da Ásia emergente viu o seu peso no total mundial aumentar de 4,8% para 11,2%. O gráfico também nos indica com clareza quem foi o principal responsável por esta evolução, i.e., a República Popular da China, cujo peso no PIB mundial se eleva agora a 6,6%, quando em 1990 era de apenas 1,7%. No entanto, em todas as restantes economias asiáticas se observaram acréscimos nos respectivos pesos, com destaque, pela sua relevância, para a Índia (de 1,4% para 2,1%, no período em análise) e para a Indonésia (de 0,6% para 0,8%).

O gráfico em causa também nos mostra a outra face, ou seja, a drástica diminuição/estagnação do peso das economias asiáticas industrializadas a nível mundial. O Japão foi, naturalmente, o mais penalizado, também porque políticas económicas pouco apropriadas lançaram o país, na década de 90, numa espiral deflacionista que só agora parece começar a ser ultrapassada.

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Raízes do fenómeno… e da sua incidência díspar!

O forte crescimento de um grupo relativamente alargado de mercados emergentes tem sido nos últimos anos sustentado, segundo o próprio Fundo Monetário Internacional, por ganhos significativos de produtividade, à medida que estas economias se vão integrando na economia global, por melhorias nos termos de troca associadas ao aumento dos preços das matérias-primas e das mercadorias nos mercados internacionais e, por último, pelo fortalecimento da sua própria organização em matéria de política económica.

No processo de crescimento acelerado das economias emergentes podem ser identificadas duas fases que, pese embora tenham algumas características em comum, devem ser identificadas separadamente. Inicialmente, alguns países asiáticos sustentaram crescimentos acelerados com base numa industrialização massiva, a partir de vantagens competitivas assinaláveis, ao nível do factor trabalho, a que se juntaram políticas económicas (sobretudo ao nível cambial e monetário), muito favoráveis à exportação, que se queria dinamizar. Assim começou a Coreia, depois a China e, antes de qualquer um destes países, o próprio Japão, ainda hoje a 2.ª economia mundial.

Todavia, nos anos mais recentes, um outro factor veio propiciar crescimentos massivos de algumas economias, muitas delas já integradas no grupo das economias chamadas «avançadas». Referimo-nos aos recursos energéticos e, em particular, ao petróleo, cuja posse tem sido determinante para a dinamização do crescimento económico de muitos de alguns mercados emergentes.

Ora, estando estes recursos concentrados num número muito reduzido de países, o aumento dos preços acaba por ter efeitos positivos limitados à dúzia e meia de economias produtoras e, pelo contrário, penaliza todos os outras economias emergentes que dele também necessitam. No entanto, a escalada dos preços das matérias-primas esteve longe de se confinar apenas ao petróleo, tendo-se generalizado aos produtos agrícolas, aos minerais e a grande parte dos bens transformados.

Neste contexto, continua a ser assustadora a fragilidade económica evidenciada pelo continente negro. Dir-se-á que o crescimento registado em África nos últimos anos suplantou manifestamente o ocorrido nas economias avançadas e mesmo em grupos de mercados emergentes, como a América Latina. (2) Todavia, tendo em conta os desenvolvimentos em matéria de preços dos produtos de base nos mercados internacionais e a forte presença dos africanos enquanto exportadores nos mercados internacionais, é incompreensível que, no seu conjunto, este continente continue a ter um peso no PIB mundial inferior ao da China e pouco distante do peso do Brasil! (3)

Olhando para os factores apontados como causas próximas do crescimento acelerado das economias emergentes, fica claro que alguns deles não foram propriamente favoráveis para algumas zonas do globo. Por exemplo, o número de países importadores de petróleo em África é incomparavelmente inferior aqueles que são excedentários e, portanto, o acréscimo do preço do crude não é favorável, em termos globais, para o continente.

Todavia, como já foi referido, esta escalada dos preços também atingiu outro tipo de produtos de base que existem em abundância no continente negro, pelo que é difícil entender o marasmo em que continua embrenhada a maior parte das economias africanas, sem equacionar a hipótese de que os erros em matéria de política económica se têm multiplicado pelo continente.

 

Sombras sobre as economias avançadas?

No momento em que este texto está a ser ultimado (Junho de 2008), as expectativas quanto ao futuro próximo para as principais economias mundiais são tudo menos animadoras.

Nos EUA, os sinais recessivos teimam em manter-se, ainda que seja bem provável que a economia consiga passar ao lado da chamada «recessão técnica» (dois trimestres consecutivos de crescimento negativo do PIB), ou mesmo de ver o PIB contrair nalgum dos próximos trimestres. No entanto, o mercado da construção/habitação continua em queda livre, ensinando-nos a história económica não só como são geralmente devastadoras as consequências destes fenómenos a nível da actividade económica em geral, como ainda quão demorada é, em regra, a recuperação (4). Por outro lado, os problemas a nível do sector financeiro estão longe de estarem resolvidos, devendo ainda ser preciso esperar longos meses até se poder concluir que os bancos afastaram finalmente o espectro de uma falência induzida por perdas massivas nos mercados de crédito de elevado risco (o chamado subprime ). Perante este cenário, receia-se que as empresas não financeiras comecem igualmente a sentir dificuldades, a que reagirão muito provavelmente recorrendo a cortes de pessoal, o que poderá então criar um cocktail verdadeiramente explosivo e com consequências económicas imprevisíveis.

Por razões distintas, as perspectivas na Europa e na Ásia avançada não são muito mais animadoras, pelo que, com excepção de algumas economias avançadas que continuarão a beneficiar da sua posição privilegiada enquanto exportadores de commodities (casos da Austrália, da Noruega e, até certo ponto, do próprio Canadá), no geral, se espera que o contributo para o crescimento global das economias avançadas continue muito deprimido.

 

Conclusões

A trajectória de aproximação entre as economias avançadas e os mercados emergentes deve prosseguir nos próximos anos, com os primeiros a manterem ritmos de crescimento fracos, caso a crise dos mercados financeiros não seja entretanto ultrapassada, ou moderados, num cenário mais optimista de recuperação dos sectores da construção/habitação e dos mercados financeiros. Enquanto isto, as economias emergentes poderão continuar a contar com a muito provável trajectória de crescimento dos preços das matérias-primas e mercadorias, a par da dinâmica muito própria de um consumo privado robusto e sustentado por crescimentos populacionais significativos.

Este cenário, não necessariamente desfavorável, mesmo na perspectiva de uma certa justiça social no planeta e, certamente, de um equilíbrio geopolítico que permita afastar os sinais de conflito entre as nações, tem todavia implícito um risco, a nosso ver, tremendo.

Por um lado, os ganhos para os mercados emergentes continuam, como se demonstrou neste texto, muito concentrados num leque reduzido de países. Ao invés, em largas dezenas de países, sobretudo no continente negro, corre-se o risco de assistir ao aumento da fome e ao recuo do crescimento, sobretudo agora que os aumentos dos preços dos bens alimentares se constituem como uma ameaça à própria ordem social.

Finalmente, resta saber qual será o impacto no resto do mundo de um abrandamento económico mais prolongado ou mais expressivo nas economias avançadas. No último meio século, «sempre que a locomotiva mundial espirrava, as economias mais desfavorecidas constipavam-se».

Terá o mundo económico mudado suficientemente para, desta vez, tudo ser diferente? Ou, ao invés, irão países como a China e a Índia ser fortemente penalizados pelo abrandamento económico a Ocidente e, por sua vez, eles próprios (através da redução da procura, designadamente de matérias-primas) induzir um recuo considerável no dinamismo que as economias emergentes têm vindo a evidenciar.

Independentemente das respostas a estas questões, uma coisa é certa: pelo menos desde meados dos anos 70 o crescimento dos preços não aparecia de forma tão central no leque das preocupações dos economistas (e, porque não dizê-lo, dos agentes económicos em geral). Se a isso juntarmos um cenário macroeconómico deprimido, podemos então ter os ingredientes de um fenómeno mais complicado (a estagflação, i.e., combinação de estagnação económica com forte inflação), que, não sendo o cenário mais provável para o autor destas linhas, é provavelmente o risco a que se atribui, de momento, a maior relevância.

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1 - Trata-se de uma metodologia bastante mais adequada quando se pretende analisar comparativamente países ou grupos de países com profundas desigualdades em matéria de rendimentos, comportamentos de consumo, etc.

2 - Segundo o FMI, o crescimento do PIB africano foi de 5,9%, em 2006, e de 6,2%, em 2007, superior ao ocorrido no designado Hemisfério Ocidental (genericamente, a América Latina), de 5,5% e 5,6%, respectivamente.

3 - Em 2007, a África, no seu todo, era responsável por apenas 3% do PIB mundial, ao passo que a Rússia representava 3,2% desse PIB e o Brasil 2,8%.

4 - Alguns economistas defendem que a recuperação de um ciclo recessivo no mercado da construção/habitação chega a demorar décadas, apontando como exemplos a Grande Depressão dos anos 30 do século XX ou ainda a crise japonesa dos anos 80/90 do mesmo século.

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* Henrique Morais

Licenciado em Economia. Mestre em Economia Internacional pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Docente na Universidade Autónoma de Lisboa e na Universidade do Algarve. Assessor do Banco de Portugal. Membro do Conselho Directivo do Observatório das Relações Exteriores da UAL.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
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