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A NATO e o próximo alargamento para Leste

Luís Leitão Tomé e Paula Monge Tomé *

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Os EUA demonstraram pouca confiança na acção colectiva, nomeadamente via NATO, para a realização de uma intervenção no Afeganistão. A coligação internacional angariada pelos EUA para a luta contra o terrorismo serviu sobretudo para a obtenção de apoio político para a “sua causa”. O sucesso desta campanha militar constituiu um tributo à capacidade militar americana, podendo contribuir para o reforço de ideias sobre a supremacia e a omnipotência americanas. A Rússia aproveitou a conjuntura para se oferecer como parceira dos EUA, o que lhe permitiu obter uma série de contrapartidas.

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A admissão de novos membros na NATO já está assente e prefigura uma significativa extensão e transformação dos compromissos militares dos EUA e da Aliança.

Curiosamente, o debate em torno desta questão tem sido escasso, senão mesmo inexistente, não havendo uma discussão pública sobre as respectivas implicações estratégicas. Não é só uma galopada em direcção às zonas anteriormente sob o domínio do velho inimigo soviético, para “colmatar um vazio e harmonizar a estratégia” – é a natureza e o futuro da Aliança Atlântica que estão em questão. Na realidade, a NATO já não é o que era, e a questão do alargamento é indissociável da sua evolução: de uma organização estritamente de Defesa colectiva, de cariz essencialmente militar, evoluiu para uma organização de Segurança e Defesa, e com um cariz bem mais político. A promoção da paz e da segurança no continente europeu parece ser cada vez mais a sua vocação nesta ordem que ainda denominamos de “pós-guerra fria” (como demonstram as suas intervenções na Bósnia, no Kosovo e a sua disposição para entrar na “guerra contra o terrorismo”), mais do que a defesa da integridade dos territórios, das soberanias e das populações dos seus membros perante uma ameaça comum e claramente identificada. No entanto, aquilo que os candidatos à adesão verdadeiramente procuram é um compromisso de defesa por parte dos EUA via Artigo 5º do Tratado de Washington.

 

Os candidatos

Ao todo, são nove os candidatos – os três bálticos (Estónia, Letónia e Lituânia), dois da Europa Central (Eslováquia e Eslovénia) e quatro da “Europa Balcânica” ou do Sudeste Europeu (Albânia, Bulgária, Macedónia e Roménia). No horizonte, perfila-se igualmente a Croácia. Em Novembro, em Praga, os actuais 19 países-membros da Aliança Atlântica vão anunciar formalmente quem são os novos aderentes. A questão está, pois, em saber quem será convidado. A crer nos media e lendo nas entrelinhas de algumas declarações, a Albânia e a Macedónia não reúnem as “condições desejáveis” e a sua rápida adesão estará liminarmente afastada. A Roménia e a Eslovénia são praticamente certas, até porque quando se discutiu o anterior alargamento (que permitiu as adesões da Polónia, da Hungria e da República Checa), alguns países europeus, a começar pela França, bateram-se pelas adesões destes dois países do Centro e Sudeste Europeu.

A Bulgária fez uma evolução significativa nos últimos anos e acaba por estar também na linha da frente, até porque o seu posicionamento geoestratégico (tal como o da Roménia) assume nova relevância aos olhos de Washington, já que o Mar Negro é um verdadeiro trampolim para o Cáucaso e a Ásia Central e por aí poderão ser canalizadas muitas das riquezas do Mar Cáspio. Conscientes disso mesmo, a Roménia e a Bulgária apressaram-se a explorá-lo, concedendo aos EUA facilidades militares inéditas na crise que se seguiu ao 11 de Setembro. Estes dois países gozam ainda do apoio dos actuais Aliados do Sul e Sudeste Europeu, em particular da França, da Grécia e da Turquia, que procuram assim contrabalançar uma reorientação demasiado centrada a Leste. Este é, aliás, também um dos dilemas de Portugal.

A Eslováquia também era dada como quase certa, mas tudo dependerá dos resultados das eleições que ocorrerem nesse país imediatamente antes da Cimeira de Praga. Os três países bálticos (Estónia, Letónia e Lituânia) serão, talvez, os que mais razões têm para procurar uma garantia de defesa, quer em função da sua História quer em razão do seu “encravamento” geográfico. Mas a sua adesão à NATO é a questão mais sensível para Moscovo neste processo, já que pertenceram ao antigo império russo e depois foram de novo anexados à então URSS no início da II Guerra Mundial (ganhando de novo a independência em 1991). Por isso, a sua entrada na NATO tem merecido algumas reservas também entre alguns analistas e líderes europeus. No entanto, são dados como “inquestionáveis” pelos EUA que querem deixar claro que a Rússia já não tem “direitos imperiais” sobre a região e que esses países devem poder dispor do seu próprio destino, sem depender do “veto” de outros. A adesão dos bálticos levanta ainda a questão sobre o enclave russo de Kalininegrado (a antiga germânica Königsberg), situado entre a Polónia e a Lituânia (dois países que têm muita História em comum), separado da Grande Rússia pelo “corredor lituano”, e que mantém até hoje o nome “soviético” associado a Mikhail Kalinin, em tempos Presidente da URSS com Estaline. No futuro, haverá, portanto, uma pequena parcela do território russo completamente “cercado” (alguns preferirão “envolvido”) por territórios de países membros da NATO.

A vulnerabilidade de Kalininegrado pode então contribuir para uma mais ampla cooperação de Moscovo nos assuntos europeus; mas pode também, ao invés, fomentar hostilidades (como no passado aconteceu quer com Berlim Ocidental quer com a cidade de Dantzig, a Prússia Oriental e o “corredor polaco”, desta feita em relação à Alemanha). Kalininegrado – que para muitos representa uma versão em miniatura dos piores aspectos da Rússia contemporânea – tem no seu território armamento nuclear e pode vir a ser, mais do que um refém, um verdadeiro “campo minado” para as relações russo-ocidentais. Os líderes da NATO deverão, assim, optar entre cinco e sete novos membros (além da Albânia e da Macedónia, que certamente não deverão entrar, as outras dúvidas prendem-se com a Eslováquia e a Bulgária) – é a tal opção “big bang” que alguns anunciam. Em tal cenário, a NATO consolida-se na Europa Central, envolve o Báltico, afirma-se no Mar Negro, espreita o Cáucaso e aponta a Ásia Central e a Europa Oriental. Para alguns será um pesadelo; para outros uma mudança de carácter; para outros ainda, uma evolução natural em função das novas realidades. No entanto, a Cimeira de Praga pode reservar surpresas...

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Novo relacionamento NATO-Rússia

Para fazer um “alargamento sem dor”, a NATO tem que clarificar e melhorar as suas relações com a Rússia, que sempre se opôs à expansão da Aliança. O 11 de Setembro ajudou à convergência de posições. Os candidatos chegaram a temer que se adiasse o processo em função das novas prioridades associadas à guerra contra o terrorismo, à nova parceria EUA-Rússia e à nova preponderância de outras regiões do globo. No entanto, entusiasmados pela súbita melhoria das suas relações, os líderes dos países da NATO (a começar obviamente pelos EUA) e da Rússia abriram claramente novas oportunidades para uma colaboração mais estreita e um relacionamento mais profundo.

O objectivo principal da Rússia não se alterou: quer, acima de tudo, ser tratada como uma potência influente na tomada de decisões. Por isso, ambas as partes concordaram em criar um novo Conselho NATO-Rússia, esperando enterrar definitivamente os mal-entendidos sobre o “Acto Fundador” e o Conselho Conjunto Permanente, criados em 1997 precisamente antes da NATO convidar a Polónia, a Hungria e a República Checa a aderirem. É a concretização de um sonho russo e da promessa de que acabaram os tempos da NATO a “19 mais 1” que os russos frequentemente acusaram de ser “19 contra 1”. Depois de “dar à Rússia voz mas não veto”, a NATO dá agora a Moscovo a possibilidade de, pela primeira vez, participar nas decisões da Aliança em matérias como a luta contra o terrorismo e contra a proliferação das armas de destruição maciça, a emergência civil, as crises humanitárias e os conflitos étnicos. A criação deste mecanismo “a 20” com a Rússia, sem posições previamente coordenadas, não significa que a Rússia tenha um direito de veto sobre a tomada de decisões da Aliança: a NATO continuará a manter a sua liberdade de tomada de decisões e de acção sobre qualquer questão compatível com as suas responsabilidades nos termos do Tratado de Washington e do seu novo conceito estratégico. Mas é importante para a segurança europeia que a NATO e a Rússia possam trabalhar em conjunto nalgumas áreas comuns. Cinicamente, há quem diga que a “NATO a 20” serve apenas para “silenciar” Moscovo até nova expansão da Aliança, e que depois disso acontecerá ao Conselho NATO-Rússia o mesmo que sucedeu ao “Acto Fundador”– primeiro “esquecido”, depois suspenso devido à crise do Kosovo. A ver vamos o que acontece depois da Cimeira de Praga.

 

Duas questões finais para reflectir

Primeira, deve ou não encarar-se a possibilidade da adesão da Rússia à NATO, no futuro? Segunda, não há outra alternativa para os países candidatos senão a integração na NATO? Não seria possível que os candidatos obtivessem uma situação tipo Finlândia – também uma antiga possessão russa, um país do Báltico e com fronteiras terrestres com a Rússia... –, perfeitamente integrada na “Comunidade Ocidental” mas mantendo-se fora das estruturas da Aliança?

E porque não a neutralidade à semelhança da Suíça e da Áustria? Além destes, recordemos que, por exemplo, também a Suécia e a Irlanda não integram a NATO...

 

Informação complementar

Vantagens e inconvenientes do alargamento da NATO

Em abstracto, os argumentos tradicionais que justificarão o alargamento da NATO são os seguintes:

• Poder contribuir para fomentar a paz e para aumentar a segurança e a estabilidade na Europa no seu conjunto;

• Aumentar a segurança dos membros-NATO, até porque reforça o “eixo europeu”;

• Aumentar a segurança dos candidatos, dos parceiros e de outros;

• Funciona como um incentivo às boas reformas e ao bom comportamento dos candidatos;

• Pode vir a ser útil no futuro perante a reemergência de uma Rússia poderosa e expansionista;

• Como única organização militar efectiva, é desejável que a NATO associe às suas acções e decisões o maior número possível de países.

Como desvantagens, argumenta-se com

• Pode criar novas linhas de fractura na Europa;

• Pode acirrar sensibilidades russas, tornar Moscovo menos cooperante e até fragilizar as posições daqueles que na Rússia são mais pró-ocidentais;

• Pode minar toda a segurança europeia e diminuir, na prática, a segurança dos actuais membros da NATO e dos outros;

• Pode perturbar a coesão entre Aliados em virtude da reorientação estratégica da NATO e da natureza da própria Aliança;

• Pode levar à desconfiguração ou até à diluição da Aliança. Como tudo é uma questão de estratégia e dos interesses de quem a dita, uma NATO em expansão (onde será mais difícil o consenso porque terá mais membros com direito a veto) tornar-se-á cada vez mais um palco para os EUA buscarem apoio político para as suas iniciativas em vez de funcionar efectivamente como uma verdadeira organização de segurança;

• Do ponto de vista militar, não haverá nenhum valor acrescentado significativo. Todos os países candidatos se debatem com problemas de recursos e estruturas obsoletas, o que torna difícil a interoperacionalidade necessária e muito dispendiosa a tarefa de reconversão e modernização das suas capacidades – o que, por sua vez, pode fragilizar ainda mais as suas débeis economias e desviar apoios aos membros actuais.

• Independentemente de se concordar mais com uma ou outra perspectiva, a questão coloca-se agora em relação a um determinado número concreto de países. Por isso, devemos ter em conta cada candidato ou grupo de candidatos, pois há significativas diferenças.

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* Luís Leitão Tomé

Licenciado em Relações Internacionais pela UAL. Mestre em Estratégia pelo ISCSP. Docente na UAL. Investigador na NATO. Assitente no Parlamento Europeu.

* Paula Monge Tomé

Licenciada em Relações Internacionais pela UAL. Mestre em Estratégia pelo ISCSP. Investigadora da NATO. Investigadora de História Contemporânea.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Alargamento da NATO: número de efectivos dos países candidatos

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