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Janus 2004



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A visibilidade externa da cultura portuguesa (I)

Teresa Maia e Carmo *

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Apesar do reconhecido potencial da cultura portuguesa como veículo de projecção exterior, quando comparada com os domínios económico e político, as decisões políticas tomadas nos anos mais recentes contribuíram para minar a sua dinâmica – a representação em festivais, feiras ou mostras internacionais diminuiu ou tornou-se quase inexistente, vítima da diminuição de apoios, sobretudo financeiros, na sequência do corte das verbas afectas ao Ministério da Cultura. Alguns sucessos foram alcançados: Siza Vieira e Manoel de Oliveira continuam a ganhar reconhecimento internacional.

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A cultura é, de longe, a área em que Portugal tem mais valores na cena internacional. Sobretudo se comparada com qualquer outra escala de indicadores que definem a posição hierárquica do país no mundo. Nas artes, em cada vez mais domínios, temos nomes que atingem um nível de notoriedade e protagonismo internacionais muito acima do potencial económico, político ou outro que o Estado semiperiférico que somos projecta.

Na literatura (Saramago, Lobo Antunes), no cinema (Oliveira, César Monteiro), na arquitectura (Siza, Souto Moura), nas artes plásticas (Sarmento, Cabrita Reis) e em tantos domínios da criação contemporânea – os nomes citados servem apenas para encurtar razões – Portugal bate-se hoje na primeira linha do que de mais estimulante acontece no globo. A cultura deveria, pois, ser a guarda avançada da imagem do país no exterior. Estranhamente, não é. É, isso sim (mais uma) vítima da atávica mercearia partidária que a cada mudança de cor dos governos faz com que brote uma compulsão inexplicável de reinventar a roda. Ou seja, após um continuado esforço de mais de uma década para projectar um Portugal moderno e descomplexado, operado de resto por forças políticas multicolores, parece ter-se caído num desalento, numa apatia abúlica que volta a remeter a cultura para o pátio das traseiras das prioridades estratégicas nacionais.

A equação é relativamente simples: num mundo globalizado e aberto à multiculturalidade, a maior chance de um pequeno país é lançar os seus valores ao mundo de forma musculada e consequente.

 

Alavanca antipessimismo

Quaisquer que sejam os seus pontos fortes – tecnologia, know how financeiro, condições de trabalho, recursos naturais... – no nosso caso, é a cultura. (Os quadros anexos demonstram-no vivamente. José Saramago, Siza Vieira e Manoel de Oliveira são os pontas-de-lança mais assiduamente distinguidos com alguns dos mais importantes prémios no mundo). Ela poderia, mesmo no plano interno, ser a alavanca para ultrapassar o momento de pessimismo generalizado que se verifica na sociedade portuguesa.

Quando o responsável pela pasta dos Negócios Estrangeiros fala da “diplomacia cultural, logo a seguir à diplomacia económica” como um dos pilares para a afirmação de Portugal, tudo parece bater certo. E no entanto, comparando a actualidade com o ponto de situação feito há dois anos, desenha-se um contraste embaraçoso. Detectava-se um conjunto de sinais que apontavam para uma estratégia de consolidação de, ao menos, uma ideia de política cultural cosmopolita.

No último quartel do século XX Portugal foi, mal ou bem, acompanhando os temas centrais em discussão na agenda europeia. A saber: a dimensão dos acontecimentos culturais, preocupação do início da década de 80, evoluindo para as questões do financiamento privado à cultura, através do mecenato (um esforço que se revela ainda incipiente) e, em 90, o multiculturalismo e as redes.

A Europália, a Lisboa 94, a Expo e o Nobel da Literatura em 98, o Porto 2001, assim como uma visibilidade crescente nos mais importantes certames internacionais, nos sectores do Livro (país-tema em Frankfurt e no Salon de Paris), Cinema, Teatro, Dança e Artes Plásticas formaram uma cadeia de acontecimentos que sugeria um élan, com qualquer coisa de arranque irreversível. Porém, em contraste com os nove filmes seleccionados oficialmente para Veneza em 2001 e os dois prémios obtidos, tivemos em 2002... um filme a concurso. No mesmo ano, a representação portuguesa na Ar.Co de Madrid (a mais relevante para o mercado nacional) baixou de 18 para 13 galerias.

O número de escritores e editores presentes em encontros internacionais desceu significativamente. No Salon du Livre de Paris, após o enorme investimento feito em 2000, em que Portugal foi convidado de honra, as principais entidades do sector (IPLB, APEL e UEP) optaram por não estar presentes, ficando a (modesta) representação portuguesa inteiramente a cargo do Instituto Camões (ICA).

No cinema, basta um olhar aos quadros sobre a presença de filmes portugueses em festivais internacionais para se perceber que uma boa parte é constituída por obras mal conhecidas nacionalmente. Seguir a produção da mais jovem geração de cineastas portugueses é empreitada que exige esforço e considerável atenção ao circuito de distribuição, comercial e alternativo. Iniciativas multidisciplinares envolvendo as entidades mais operativas no sector, como o Perfil de Portugal em Espanha ou o Festival New Portuguese Culture nos EUA – autênticas embaixadas dos valores culturais portugueses tradicionais e contemporâneos – não mais se viram.

 

Desinvestimento

Sobra, assim, a ideia de um desinvestimento confrangedor. Os cortes orçamentais em toda a administração pública por via de uma situação económica periclitante face ao espartilho dos critérios de convergência europeus verificaram-se talvez com mais dureza no ministério que tutela a cultura, com um orçamento sempre apertado (no ano mais generoso representou escassos 0,2% do Orçamento Geral do Estado). Tal gesto implicou a fusão de organismos que vinham a funcionar como pilares na sua área de actuação, como o IPA, criado com a explosão da arqueologia portuguesa que se seguiu à descoberta de Foz Coa (agora fundido com o IPPAR, instituto do património) ou, mais grave, do IAC (arte contemporânea) com o IPAE (artes do espectáculo), com consequências ainda em aberto, para lá do atraso de seis meses na atribuição de subsídios, na linha do permanente teste ao sangue-frio dos criadores portugueses.

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Nem tudo foram maus sinais, no entanto. Cumpre registar alguns dos índices mais relevantes para aferir da visibilidade da cultura portuguesa no estrangeiro em 2002 e 2003. A comissariar a Bienal de Sydney de 2004 está a portuguesa Isabel Carlos, cujo expressivo currículo a coloca perfeitamente à altura do desafio. Álvaro Siza Vieira, entre os muitos prémios recebidos, ganhou o concurso para a remodelação da “milha de ouro” de Madrid – o espaço público em redor do Museu do Prado – e foi escolhido pela Rolex Internacional como um dos cinco mestres mundiais das artes, numa iniciativa de mecenato desta empresa em que se subvenciona a relação entre um mestre e um discípulo durante um ano.

A Casa da Música entrou no circuito internacional com a adesão a dois dos mais importantes organismos internacionais, a ISPA (International Society of Performing Arts) e a IAMA (International Artist’s Managers Association). Álvaro de Campos chegou na íntegra ao Brasil, pela mão da Campo das Letras, num trabalho da investigadora Teresa Rita Lopes, com “Poesias”.

O imparável Manoel de Oliveira soma e segue, com êxito assinalável de crítica e público nas estreias de “O Princípio da Incerteza” em França, e de “Vou para Casa” em Chicago. O mais internacional dos grupos musicais portugueses, Madredeus, grava com a Orquestra da Rádio Flamenga. A rentrée francesa de 2002 foi fortemente portuguesa: a Semana das Culturas Estrangeiras, organizada por três dezenas de centros e institutos culturais, mostrou dezoito filmes portugueses, lançou um Guia Michelin dedicado a Portugal, e proporcionou a edição francesa de vários autores nacionais.

 

Internacionalização da literatura

Em 2003, Camões chegou à Pleiade, a mais prestigiada colecção francesa, no âmbito do colóquio “Edição de Autores Portugueses no Estrangeiro”, organizado pelo Centro Cultural Calouste Gulbenkian em Paris. As conclusões ali apresentadas mostram que a literatura portuguesa atinge já uma significativa presença na Europa, após um quase desconhecimento que durou até à década de 80 e foi luminosamente rompido com a consagração de Fernando Pessoa. Não é que não existissem traduções de clássicos portugueses em França, Itália, Alemanha ou Espanha desde o século XVI. Camões, Padre António Vieira ou Francisco Manuel de Melo estavam acessíveis.

Mas foi apenas nos últimos vinte anos que a tradução de autores portugueses no estrangeiro conheceu uma espécie de boom. Em parte devido à emergência de uma geração literária importante, onde pontificam, à cabeça, José Saramago e António Lobo Antunes – os mais vendidos – seguidos de um interesse crescente por nomes como José Cardoso Pires, Lídia Jorge ou Mário de Carvalho e os contemporâneos do espaço lusófono José Craveirinha, Mia Couto e José Eduardo Agualusa, cada vez mais solicitados.

Por outro lado, contribuiu para o fenómeno o crescente apoio por parte de entidades como a Fundação Calouste Gulbenkian (no início dos anos 80), seguida do Instituto Português do Livro e das Bibliotecas e, mais tarde, do Instituto Camões.

Nos anos 90, os apoios à internacionalização da literatura portuguesa diversificaram-se e há a registar com entusiasmo o papel de instituições como a Fundação Oriente, o Instituto do Oriente e a Fundação Luso-Americana. França é o mercado que concentra o maior número de traduções (330 títulos nos últimos vinte anos), mas existem já dezenas na Hungria ou República Checa, Coreia, Rússia, China e Japão.

 

Informação Complementar

Pedro Cabrita Reis

Pedro Cabrita Reis representou Portugal na 50.ª edição da Bienal de Veneza. O pavilhão português, produzido pelo entretanto extinto Instituto de Arte Contemporânea (IAC) e comissariado por Vicente Todolí, agora à frente dos destinos da Tate Modern, em Londres, apresentava ainda as propostas de Francisco Tropa, Jorge Queiroz e Didier Fiuza Faustino, naquilo que os responsáveis entenderam ser o melhor das propostas portuguesas nas artes plásticas contemporâneas. Cabrita Reis apresentou ainda duas obras inéditas, uma delas especialmente concebida para o evento. Chamou-se “Absent Names” e ficou instalada nos jardins do recinto. Durante a Bienal foi lançada uma monografia sobre a vida e obra do artista, com 300 páginas e 200 ilustrações, publicada pela editora alemã Clotz. É a justa consagração de um dos mais importantes artistas da sua geração, aquele que se diz que há-de ficar quando se fizerem as contas. Nascido em Lisboa em 1956, estreia-se em 1981 com duas exposições individuais de pintura (na SNBA e Diferença) passando rapidamente para a instalação, escultura, fotografia e vídeo. Faz parte da geração de 80, dotada de uma singular inventiva plástica, e obteve desde o início um acolhimento notável nos circuitos internacionais, sendo hoje uma referência no universo da arte contemporânea. Integra algumas das mais relevantes colecções mundiais e expõe com regularidade nos principais museus de todo o mundo. Este artista apaixonado pelo acto da construção que não acredita na arte como salvadora do mundo, “uma espécie de cruz vermelha dos sentimentos”, é um dos valores mais seguros do panorama nacional e internacional do momento.

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* Teresa Maia e Carmo

Licenciada em Comunicação Social pela Universidade Nova de Lisboa - FCSH. Mestre em Comunicação Educacional Multimédia pela Universidade Aberta. Doutoranda em Comunicação pela Universidade Complutense de Madrid. Docente na UAL. Jornalista.

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Dados adicionais
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