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Janus 2006



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UE, desenvolvimento e ajuda humanitária

Luís Tomé *

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No ensejo de se impor como protagonista mundial e de afirmar os seus valores no seio da sociedade internacional, a União Europeia faz grande apelo do seu autoproclamado “ soft power ” nas relações externas, em que o auxílio ao desenvolvimento e a ajuda humanitária são vectores essenciais. Porém, o seu significativo contributo nestas matérias não é equivalente ao seu impacto nas relações internacionais em geral.

 

A política de desenvolvimento da UE

Colectivamente, a União Europeia representa cerca de 55% da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD). Este auxílio, distribuído em todo o mundo por cerca de 160 países, territórios ou organizações, visa erradicar a pobreza através do desenvolvimento sustentável e facultar às populações dos países menos desenvolvidos os meios necessários para gerir o seu próprio desenvolvimento. Por este motivo, além de ajudar os países necessitados a melhorar as suas infra-estruturas, garantir uma melhor alimentação e o fornecimento de água potável, melhorar o acesso à educação, à saúde, ao emprego ou desenvolver as suas capacidades de produção, a estratégia de desenvolvimento da UE destina-se igualmente a promover a democracia, o respeito pelos direitos humanos, em particular das mulheres e crianças, a paz e a segurança, a equidade social e a defesa do ambiente. Esta visão integrada da política externa para o desenvolvimento é testemunhada, por exemplo, em 2004, com a atribuição de cerca de 770 milhões de euros à promoção da igualdade entre géneros, 100 milhões de euros em favor da promoção dos direitos humanos, o apoio dado à promoção da paz, da estabilidade e reconstrução de países como o Afeganistão, Timor-Leste, RD Congo, Haiti, Fidji ou Iraque, a participação em missões de observação e assistência eleitoral (Afeganistão, Indonésia, Malawi, Moçambique, Sri Lanka, Palestina – Cisjordânia e Gaza – e Iraque), ou a aprovação de um orçamento de 250 milhões de euros para apoiar a força de manutenção de paz da União Africana. No quadro dos preparativos para a reforma das Nações Unidas, a União aprovou um relatório onde se recomendam novas formas de financiamento do desenvolvimento.

Vários elementos contribuem para a aproximação colectiva e integrada da UE para o desenvolvimento: contribuições e envolvimento directo nacional dos Estados--membros na ajuda ao desenvolvimento; a Política de Desenvolvimento da Comissão e as decisões e programas do Conselho (como os “Compromissos de Barcelona”); o novo Acordo de Cotonou, acordado entre os Estados-membros e 78 países da África, Caraíbas e Pacífico (países ACP); a reforma e reorganização dos serviços externos da União, como o estabelecimento, em 2001, do Serviço de Cooperação EuropeAid; o auxílio aos Países Pobres Altamente Endividados (iniciativa HIPC); a Nova Política Europeia de Vizinhança, estabelecida em 2003; ou a parceria com outros actores internacionais, como o Banco Mundial, a OCDE e, em particular, as Nações Unidas.

A UE e os Estados-membros apoiam firmemente os Objectivos do Milénio para o Desenvolvimento adoptados pelas Nações Unidas em Setembro de 2000: reduzir a pobreza extrema e a fome para, a prazo, as erradicar; instituir o acesso universal ao ensino primário; promover a igualdade entre os sexos e a emancipação das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o VIH/sida, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental; e instaurar uma parceria mundial para o desenvolvimento. Enquanto organização, a UE procura apoiar a concretização destes objectivos privilegiando seis domínios prioritários em que adquiriu uma competência específica: comércio e desenvolvimento; cooperação regional; políticas de redução da pobreza para promover a saúde e a educação; infra-estruturas de transporte; segurança alimentar e desenvolvimento rural sustentável; reforço das capacidades institucionais, boa governação e Estado de direito.

Em Novembro de 2000, a União adoptou um quadro global único para guiar a sua política de desenvolvimento e determinou, em estreita cooperação com outras organizações internacionais, um conjunto de 10 indicadores-chave que, em 2003, começaram a ser utilizados para avaliar as performances dos países e das regiões aos quais presta auxílio.

Em 2005, a União associou-se às conclusões da cimeira do G-8 (Julho, em Gleneagles), por exemplo, no sentido de aumentar a Ajuda Pública ao Desenvolvimento em 50 mil milhões de USD por ano até 2010, metade dos quais para África (o que implica duplicar a ajuda), renovando o compromisso de os países mais ricos atingirem a meta de 0,7% do seu PIB destinada à APD em 2015; o perdão total da dívida de 18 Países Pobres Altamente Endividados-HIPC (14 dos quais africanos), continuando as negociações com mais nove; ou acabar com os subsídios agrícolas dos países ricos numa data “credível” (e sabe-se como esta questão é sensível para a UE!). Aliás, já nas conclusões do Conselho Europeu de 16-17 de Junho de 2005, a União “nota com satisfação que os seus Estados-membros estão em vias de concretizar a meta de 0,36% do seu PIB para a APD em 2006, conforme os Compromissos de Barcelona. Reafirmando a sua determinação nestes compromissos, o Conselho decidiu como nova meta colectiva para a UE um ratio PIB/APD de 0,56% em 2010. Isto equivalerá a um acréscimo adicional de 20 mil milhões de euros por ano na APD (...) reafirma intenção da UE em aumentar a sua assistência financeira à África Subsaariana ao despender colectivamente, pelo menos, 50% do aumento acordado em APD para o continente africano”.

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A ajuda humanitária da União

A UE começou a fornecer ajuda humanitária às populações necessitadas do mundo inteiro na década de 70. Porém, os desenvolvimentos no âmbito da PESC permitem à União ter uma aproximação mais coordenada e mais célere neste domínio. Esta ajuda é incondicional, na medida em que tem por objectivo socorrer as vítimas o mais rapidamente possível, independentemente da sua raça ou religião e da orientação política dos seus governos. O auxílio humanitário da UE é concedido à escala mundial, do Cáucaso à América Central, de África ao Sudeste Asiático, e cobre desde o socorro de emergência às vítimas de catástrofes naturais (inundações, terramotos, vulcões, secas, etc.) ao apoio aos refugiados e nas zonas de conflito, nomeadamente no Iraque, Afeganistão, Territórios Palestinianos e em diversos locais de África.

A União canaliza o seu auxílio neste domínio através do seu Serviço de Ajuda Humanitária (ECHO) – desde a sua criação, em 1992, o ECHO interveio em situações de crise graves em mais de 100 países de todo o mundo, disponibilizando equipamentos de emergência, alimentos, água, medicamentos, equipas de socorro, instalações hospitalares de campanha, sistemas de comunicação provisórios, etc. O ECHO financia ainda peritos em desminagem, meios de transporte e apoio logístico. Apesar de dispor de orçamentos relativamente elevados – com decisões de financiamento anuais que se situam entre os 450 e mais de 800 mil milhões de euros –, o ECHO não dispõe dos recursos necessários para desenvolver todas aquelas actividades, pelo que trabalha em estreita colaboração com uma série de parceiros, como as ONGs, as agências especializadas da ONU, as organizações internacionais ou a Cruz Vermelha. O ano de 1999 foi aquele em que mais recursos de ajuda humanitária se afectaram, ultrapassando globalmente os 800 mil milhões de euros. Em termos regionais, o continente africano é o que mais consome desta ajuda, atingindo os 52% da assistência financeira da UE em ajuda humanitária em 2004. Relativamente aos principais parceiros do ECHO, nota-se uma clara aposta nas ONGs da União, a quem são destinados cerca de 60% das decisões financeiras do ECHO. Quanto a catástrofes, os conflitos representam cerca de 90% do financiamento do ECHO.

 

O exemplo do tsunami

O caso do tsunami na Ásia-Índico, no final de Dezembro de 2004, é um exemplo paradigmático da resposta humanitária da União, tendo só o ECHO canalizado ajudas às vítimas no valor de mais de 103 milhões de euros em 4 decisões distintas no prazo de dois meses:

• 26 Dezembro 2004: decisão de primeira urgência, disponibilizando 3 milhões de euros nas 72 horas seguintes à tragédia;

• 30 e 31 Dezembro 2004: duas decisões de urgência no valor de 10 milhões de euros cada, para auxíliar as vítimas no Sri Lanka e Maldivas e Indonésia;

• 6 Janeiro 2005: a Comissão solicita ao Parlamento e ao Conselho (Autoridade Orçamental) até 100 milhões de euros para novas acções humanitárias na região sinistrada;

• 9 Fevereiro 2005: foi adoptada uma decisão de ajuda humanitária no valor de 80 milhões de euros para fornecer ajuda e assistência, incluindo a reabilitação a curto prazo, às populações da Ásia do Sul e do Sudeste Asiático.

Se ao auxílio via Comissão/ECHO somarmos as contribuições anunciadas pelos Estados-membros, a ajuda humanitária colectiva da UE à Ásia em virtude do tsunami ultrapassa os 430 milhões de euros – Portugal contribuiu com mais de 2 milhões de euros.

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* Luís Tomé

Licenciado em Relações Internacionais pela UAL. Mestre em Estratégia pelo ISCSP. Doutorando em Relações Internacionais na Universidade de Coimbra. Professor na UAL. Investigador e Membro do Conselho Directivo do Observatório de Relações Exteriores.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
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Link em nova janela Serviço de cooperação EUROPEAID - evolução da assistência por regiões 2001-2004 compromissos contratados

Link em nova janela Serviço de cooperação EUROPEAID - evolução da assistência por regiões 2001-2004 pagamentos efectuados

Link em nova janela Quem dá o quê - ajuda pública ao desenvolvimento

Link em nova janela Distribuição do financiamento do serviço de ajuda humanitária (ECHO) (em 10 de Outubro de 2004)

Link em nova janela Decisões de financiamento de ajuda humanitária por região 2000-2004 (decisões totais só no ano de 2004: 570.412.000 euros)

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