Pesquisar

  Janus OnLine - Página inicial
  Pesquisa Avançada | Regras de Pesquisa 
 
 
Onde estou: Janus 2006> Índice de artigos > A nova diplomacia > Diplomacia económica > [ Nova diplomacia económica comparada: o caso da Itália ]  
- JANUS 2006 -

Janus 2006



Descarregar textoDescarregar (download) texto Imprimir versão amigável Imprimir versão amigável

ESTE ARTIGO CONTÉM DADOS ADICIONAIS seta CLIQUE AQUI! seta

Nova diplomacia económica comparada: o caso da Itália

Sérgio Nunes *

separador

A Itália pertence a um conjunto de países, designados de industrializados, que passaram os últimos 50 anos a construir um enquadramento político e económico, com regras comuns, legitimadas e aceites pelos seus intervenientes. Estes esforços produziram um ambiente jurídico, cujas traves mestras são a economia de mercado e mercados mundiais cada vez mais desregulamentados, acelerando a liberdade do comércio e o investimento mundial. Os contornos políticos que permitiram a criação e o reconhecimento generalizado destas convenções foram a expressão máxima dos esforços diplomáticos desenvolvidos no âmbito dos inúmeros encontros (formais e informais) nas sedes dos vários organismos internacionais criados para monitorizar a transferência e a criação de riqueza mundial.

Do ponto de vista italiano, definidas as regras do “jogo”, é urgente refinar a capacidade dos governos nacionais e enformar os serviços diplomáticos do sentido da inevitabilidade da sua contribuição efectiva para o desenvolvimento do sistema económico transalpino.

As raízes da competitividade italiana surgem aos olhos dos especialistas claras e sólidas, embora dificilmente mensuráveis em termos de indicadores internacionais comparáveis: talento, criatividade empreendedora e uma força de trabalho especializada e apresentando elevados níveis de flexibilidade (consubstanciando-se nos múltiplos “distritos industriais” existentes actualmente por grande parte do território italiano).

Na perspectiva das autoridades italianas, os governos devem desempenhar um papel activo na construção da competitividade do país, ao contrário da visão tradicional que considerava os governos imunes e desligados dessa problemática. Actualmente, os governos desempenham um papel fundamental na disponibilização de condições que permitam encurtar distâncias entre procuras e ofertas nacionais e internacionais. Promover e sustentar a competitividade actual é sinónimo de aprofundar a internacionalização. Às empresas cabe o papel motor da competitividade e aos actores governamentais cabe o papel de agilizador de serviços necessários ao aumento de produtividade empresarial.

Para poderem vir a desempenhar o papel de vectores operacionais da política externa italiana, os seus actores principais devem aprofundar as antigas especializarem-se num novo conjunto de competências.

É cada vez maior a necessidade de reorganizar e adaptar os agentes participantes face às novas direcções e aos novos conteúdos do espectro da diplomacia económica. Actualmente, os encontros neste âmbito incluem não só diplomatas, mas toda uma panóplia de políticos, gestores, técnicos ultra-especializados nos mercados e nos enquadramentos legais desses mercados, jornalistas, lobbys das ONGs, jornalistas, etc. Mais: embora os grandes objectivos da diplomacia económica possam ser claros e do conhecimento generalizado, esses só serão eficazmente atingidos com sistemas de diplomacia económica de conteúdo tão ecléctico quanto os espaços onde se pretende intervir. Tanto as técnicas económicas como as técnicas de negociação variam muito, de acordo com o palco em questão.

Falar de diplomacia económica italiana é, actualmente, sinónimo de falar da eficácia da internacionalização do sistema económico italiano. Sob a égide do actual ministro do Negócios Estrangeiros, Franco Frattini, estão em desenvolvimento um conjunto de iniciativas capazes de repensar as funções diplomáticas num contexto de complexas interdependências económicas e de produção. O espírito desta nova visão de intervenção passa por integrar a dimensão económica e cultural como pilares na nova política externa italiana, paralelamente com a tradicional dimensão puramente política. Materializa-se na procura de sinergias e complementaridades resultantes da integração, cooperação e da articulação dos diferentes agentes do sistema italiano, sem nunca descurar que os recursos são escassos e têm utilizações alternativas. Isto significa eliminar a duplicação de serviços, racionalizar a administração pública e simplificar os processos de contacto entre a esfera pública e privada.

 

Arquitectura da diplomacia económica italiana

O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) é o organismo da administração central que tem como função implementar a política externa do governo italiano. Do ponto de vista da componente que importa analisar neste âmbito (aquela que mais directamente se pode relacionar com a nova diplomacia económica), é da competência da Direcção Geral para a Cooperação Multilateral Económica e Financeira promover e desenvolver iniciativas com o Ministério das Actividades Produtivas (MAP), de suporte à internacionalização das empresas italianas e encorajar o aumento do investimento externo e turístico em Itália. Esta Direcção Geral é composta por oito departamentos. O Departamento I – Actividades Económicas e Financeiras Multilaterais, com funções mais relacionadas com a diplomacia económica em sentido estrito (relações com a OCDE, FMI, Banco Mundial, UNCTAD,...) e o Departamento III – Suporte à Internacionalização do Sistema Económico Italiano, com funções claramente no âmbito da diplomacia comercial, que se relaciona directamente com um conjunto de organismos de suporte à internacionalização do sistema produtivo italiano, nomeadamente o Instituto do Comércio Externo Italiano (ICE), a SIMEST (Agência para Promoção da Cooperação Económica com os Países da Europa de Leste), as câmaras de comércio, associações comerciais, bancárias e industriais, SACE (Serviços de Seguros ao Comércio Externo), etc.

A política externa italiana tem três grandes vectores de actuação: um vector associado às grandes áreas geográficas de intervenção, outro referente às áreas de política e o último diz respeito ao papel da Itália no mundo.

No que concerne às áreas geográficas, é dada atenção especial à África, às Américas, à Ásia, à Europa e ao Mediterrâneo e Médio Oriente. Relativamente a cada uma destas grandes áreas é feito um diagnóstico da situação política e económica, tendo relativamente a algumas áreas geográficas (nomeadamente na Ásia) a preocupação de identificar oportunidades de negócios para as empresas italianas e, principalmente, para a internacionalização do “sistema de produção italiano” baseado em PMEs italianas que desempenham um papel cada vez mais relevante na internacionalização do sistema económico italiano. O processo começou na China com a visita em 2003 do primeiro ministro Silvio Berlusconi e prosseguiu com a Índia, Coreia e Japão. Pretende-se, desta forma, promover aspectos de natureza política, económica e cultural com os países da região em causa, privilegiando relacionamentos de natureza bilateral.

No que diz respeito às grandes áreas de política, salienta-se a cooperação económica. Dentro deste campo temos alguns aspectos relacionados com a diplomacia económica em sentido estrito (FMI, Banco Mundial, OCDE,...) e um outro que se relaciona directamente com a segunda componente da nova diplomacia económica – diplomacia comercial –, que trata com bastante cuidado as empresas italianas no estrangeiro. Neste contexto, são de salientar duas preocupações fundamentais que permitem compreender melhor o modelo da nova diplomacia económica italiana.

Topo Seta de topo

Em primeiro lugar, o reposicionamento dos negócios italianos no mundo. As alterações ocorridas nas duas últimas décadas levaram as autoridades italianas a redefinirem o “onde” e o “como” da internacionalização das suas empresas. As empresas italianas aumentaram a sua presença na Europa Central e de Leste e noutras zonas fora da União Europeia. Actualmente privilegia-se mais as joint ventures, as alianças estratégicas e os investimentos, em oposição às exportações, como principal critério de competitividade externa.

Em segundo lugar, o enquadramento legal e as agências de suporte. A Lei n.º 56, de 31 de Março de 2005 (“Medidas para a internacionalização dos negócios e mandato governamental para a reorganização dos corpos que operam no mesmo sector”) enquadra uma nova forma de suporte à internacionalização do sistema produtivo italiano, articulando estratégias do MNE e do MAP, funcionando como centro de concepção e design de toda a política externa italiana. Estes departamentos geograficamente descentralizados, designados por Sportelli Italia (1), tem como objectivo criar sinergias entre a rede local empresarial e os mercados globais. Os Sportelli Italia resultam da integração logística e funcional de embaixadas, consulados e departamentos do comércio externo exercendo as funções de orientação, assistência e consultadoria aos agentes de negócios. Terão também como missão a atracção de investimentos directos para Itália e a promoção de actividades levadas a cabo nos meios locais. Decorrente do fortalecimento das relações entre o MNE e o MAP, foram realizadas, em 2004, 28 Sportelli Italia.

Quanto às agências de suporte saliente-se o apoio dado pelo Instituto do Comércio Externo Italiano (estrutura pública que tem como objectivo desenvolver, assistir e promover as relações comerciais italianas), pelo SACE (Serviços de Seguros ao Comércio Externo, que tem como função disponibilizar serviços associados à cobertura dos riscos de exportação e investimentos externos dos operadores italianos) e pelo SIMEST (funcionando com fundos do Ministério das Actividades Produtivas, tem como missão a utilização desses fundos para proteger os interesses italianos no exterior, podendo desenvolver acções desde a atribuição de subsídios até à aquisição de posições externas que beneficiem interesses italianos.

Foram também assinados acordos programáticos entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros, a Unioncamere (União Italiana das Câmaras de Comércio) e a Assocamerestero (2) (Câmaras de Comércio Italianas no Estrangeiro) com o objectivo de integrar e disponibilizar a informação económica e comercial da rede diplomática para os operadores de toda a Itália.

Finalmente, um importante apoio à internacionalização foi conseguido pelo acordo entre o Ministério das Actividades Produtivas (pela sua Direcção Geral de Promoção Comercial), o ICE e o CRUI (Conferência de Reitores das Universidades Italianas). Este acordo contempla dois campos de actuação: aproximar cada vez mais as universidades do sector empresarial e organizar no exterior acções de promoção do sistema de ensino universitário italiano.

O terceiro vector da política externa italiana diz respeito ao papel que a Itália quer desempenhar no mundo. Dentro desta componente destaca-se as acções levadas a cabo para suportar o conceito de “made by Italy”. O processo de internacionalização do sistema produtivo italiano é extremamente complexo, levado a cabo por uma diversidade de instrumentos, corpos e estruturas. Uma parte importante desta estrutura é constituída por uma rede de 159 escritórios comerciais localizados em 238 embaixadas e consulados pelo mundo inteiro. O Instituto do Comércio Externo tem 104 escritórios que, conjuntamente com 68 câmaras do comércio, com extensas ramificações, representam cerca de 23 000 empresas em 40 países, e contribuem com cerca de 82% do comércio externo italiano. O principal resultado esperado, nas palavras de Luca di Montezemolo, é desenvolver um produto que nenhum chinês alguma vez consiga copiar”.

 

O papel da diplomacia económica no futuro: aspectos conclusivos

Em termos holísticos, o sector público tem como missão endogeneizar o conceito de “qualidade total” e funcionar como plataforma de suporte à internacionalização económica e cultural italiana. Os actuais responsáveis italianos reconhecem facilmente a necessidade de deslocalização empresarial, mesmo a italiana, estando, no entanto, preocupados na retenção das componentes estratégicas e de concepção em solo nacional. O slogan pode ser descrito de uma forma simples: no actual quadro internacional a ênfase já não está no “made in Italy” estando concentrada no “made by Italy”. As autoridades italianas pretendem aprofundar a sua política comercial com a sua herança cultural, histórica e artística, exportando um modo de vida e de pensar.

Outro campo onde o sector público pode e deve desempenhar um papel fulcral na dinâmica económica italiana é nos esforços que concentra e aplica na investigação e na qualificação da sua comunidade científica. Nas sociedades da informação, o conhecimento é o recurso por excelência e a nova política externa italiana irá também apoiar e potenciar os trabalhos da comunidade científica, procurando que se obtenha também uma maior internacionalização do próprio conhecimento e de desenvolvimentos tecnológicos no seu âmbito.

A produtividade do sector científico deverá ter concretizações comercias que aumentem, por sua vez, a competitividade de todo o sistema económico. O objectivo passa não só pela maior participação das universidades nestas interdependências, mas também se pretende qualificar cientificamente as embaixadas. Para que esta ideia possa ter sustentabilidade prática foi alcançado, em 2004, um acordo entre o MAP, o ICE e a Conferência dos Reitores das Universidades Italianas.

As autoridades italianas não têm dúvida quanto ao papel da esfera económica na nova geopolítica mundial. A integração da dimensão económica não serve apenas para tornar o sistema económico italiano mais competitivo mas também para tornar a política externa mais incisiva e consistente. A eficácia da política externa (não exclusivamente económica) mede-se pelo seu alcance económico.

Em síntese, a Itália pretende levar a cabo a sua política externa bastante exigente e adopta um modelo integrado e sistémico de diplomacia económica, em que o seu êxito está directamente dependente, por um lado da capacidade de coordenação e entendimento os múltiplos organismos intervenientes demonstrem e, por outro, da dinâmica produtiva interna italiana e da zona económica onde está inserida.

separador

1 A criação de “ one-stop shops ”. Todos os agentes com responsabilidades na política externa italiana reunida num só local, representando a coesão e a integração sistémica que as autoridades italianas querem ver na aplicação da sua política externa. Esta é uma medida que pretende racionalizar (também do ponto de vista financeiro) a rede territorialmente desconcentrada de apoio à política externa italiana.
2 Projecto “ExTender”. Têm sido desenvolvidas outras iniciativas, como algumas parcerias público-privado, nomeadamente a Farnesina Task Force (juntando à mesma mesa a banca e as empresas líderes industriais). Outra iniciativa que nos parece de crucial importância é aquela que resultou do pacto proposto pelo MNE à Confindustria, similar à colaboração institucional entre o MNE e MAP – um pacto entre a diplomacia e as empresas. Esta é uma proposta pragmática que parece tocar no âmago da questão: são as empresas que lideram a dinâmica económica empresarial e é com elas e no seu âmbito que deverão ser desenvolvidos os esforços possíveis de futuros acréscimos de competitividade externa.


separador

* Sérgio Nunes

Licenciado em Economia pelo ISEG. Mestre em Economia e Gestão do Território pelo ISEG. Docente no Instituto Politécnico de Tomar.

separador

Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Principais agentes da diplomacia económica italiana

Topo Seta de topo

 

- Arquivo -
Clique na edição que quer consultar
(anos 1997 a 2005)
_____________

2005

2004

2003

2002

2001

1999-2000

1998

1998 Supl. Forças Armadas

1997
 
  Programa Operacional Sociedade de Informação Público Universidade Autónoma de Lisboa União Europeia/FEDER Portugal Digital Patrocionadores