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- JANUS 2007 -



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Portugal-Brasil: verdades e consequências para o século XXI

Sérgio Nunes *

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Comummente olham-se as relações Portugal-Brasil com uns óculos românticos e decorrentes das afinidades históricas e culturais que ligam estes dois países de séculos a esta parte. Esta posição é parcialmente compreensível. Actualmente o Brasil detém oito cidades, territórios e sítios de origem ou matriz portuguesa classificados como património mundial pela UNESCO. Portugal e Brasil têm uma língua comum e laços históricos como poucas nações no mundo. Parece-nos, contudo, contraproducente não ponderar esta perspectiva por uma outra de racionalidade económica, quer devido aos escassos resultados obtidos até agora, quer ao enquadramento internacional que fundamenta as relações entre blocos económicos distintos, que nos permita responder a algumas questões: Quais os interesses económicos e políticos de cada país? Quem ganha e quem perde? Como olhar o futuro face às respostas dadas às questões anteriores? A opção deste texto passa por fazer uma leitura da performance económica das relações entre Portugal e Brasil nos anos mais recentes.


Comércio externo

Segundo dados do Gabinete de Estratégia e Estudos (GEE) do Ministério da Economia e da Inovação, o comércio de Portugal com o Brasil representou em 2006 (dados preliminares) 9,9% das importações e 3,1% das exportações com esse destino. Em termos de mercados extra-UE(25) o Brasil ocupou a segunda posição entre os principais fornecedores, imediatamente a seguir aos EUA. Como podemos facilmente observar pelo gráfico “Balança comercial de Portugal-Brasil”, a balança comercial é claramente desfavorável a Portugal, com défices sucessivos e crescentes a partir de 1999, registando um saldo de cerca de –800.000 milhões de euros em 2005. Refira-se ainda que as últimas estimativas feitas pelo GEE do Ministério da Economia e Inovação (Maio de 2006) apontam para um aumento do valor do défice, que se deve situar acima dos –l 074 000 milhões de euros.

Desde 1996 que os termos de troca entre Portugal e Brasil se têm vindo a degradar com vantagens claras e significativas para a economia brasileira, embora em 2005 a taxa de crescimento das exportações – 15,11% – tenha ficado sensivelmente acima da taxa de crescimento das importações – 14,74%.

No que respeita aos principais produtos trocados entre os dois países, no quadro “Comércio com o Brasil (2004-2005)” estão os produtos que representam cerca de 50% das importações e das exportações para cada país. Portugal exporta Agro-Alimentares, Produtos Energéticos e Minérios e Metais, com este grupo a ganhar peso de 2004 para 2005. No que respeita às importações, Portugal adquire essencialmente produtos Agro-Alimentares, Energéticos e Minérios e Metais, também com um aumento do peso deste grupo de 2004 para 2005.

Estes valores colocam Portugal na 23.ª posição enquanto importador e a 46.ª posição enquanto exportador, lugares que demonstram a pouca importância comercial dada por estes países aos respectivos espaços comerciais.

Contra este facto estão em desenvolvimento algumas iniciativas que procuram alterar esta situação, conscientes que se vive e sobrevive numa época de mercados mundiais voláteis e hipercompetitivos e com dificuldades em encontrar e preservar-se âncoras relacionais sustentáveis. Reuniu-se a este propósito o Fórum Portugal 2006 na Federação das Indústrias de S. Paulo, estando presentes os representantes dos principais investimentos portugueses no Brasil e autoridades governamentais dos dois países. Segundo altos responsáveis do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, é necessário “estabelecer metas conjuntas para estimular o comércio bilateral”. O Brasil pretende também aumentar as suas importações, embora neste âmbito apenas ambicione produtos de elevado valor acrescentado que incorporem alta tecnologia. Foi criada também uma comissão bilateral com o objectivo de suavizar as grandes dificuldades técnicas e burocráticas que criam dificuldades aos empresários portugueses, nomeadamente no que concerne às tarifas dos produtos industriais e de serviços. Em Agosto de 2006, o primeiro ministro português visitou o Brasil com o objectivo de reforçar as relações económicas e comerciais bilaterais, fomentar o investimento brasileiro em Portugal, promover o crescimento das exportações portuguesas, estabelecer parcerias para o desenvolvimento da tecnologia brasileira de biocombustível e regularizar a situação dos imigrantes brasileiros em Portugal. As intenções são as melhores; veremos como são acolhidas pelo mundo empresarial.


Investimento

No que diz respeito ao Investimento Directo Estrangeiro (IDE), os dados mais recentes mostram uma quebra profunda e simultânea nos valores relativos ao investimento. O gráfico “Investimento Directo de Portugal no Exterior” (IDPE), que apresenta o IDPE no período de 1996 a 2005, mostra-nos que a partir de 2001 o desinvestimento no Brasil foi uma constante, ao contrário dos investimentos feitos noutros países embora com decréscimos também acentuados. O desinvestimento no Brasil foi substituído por outros mercados, com destaque para a Espanha, a França, o Reino Unido e os EUA. Embora existam investimentos relevantes no Brasil, como veremos adiante, os empresários portugueses simplesmente alteraram as suas estratégias de investimento e, em muitos casos, desistiram mesmo de investimentos externos em tempos de crise económica.

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Se se observar o gráfico “Investimento Directo do Exterior em Portugal” (IDEP) pode-se constatar que, tal como Portugal, o Brasil também se desinteressou do território português enquanto espaço económico de investimentos. Este aspecto, contudo, não tem o mesmo significado que aquele que decorre da figura anterior, uma vez que os investimentos do Brasil em Portugal nunca tiveram um significado económico relevante, como se pode observar pelos valores do gráfico “IDEP”. Este facto não é estranho ao percurso investidor dos empresários brasileiros que têm muito pouco investimento fora do Brasil (o Brasil não é considerado um investidor de primeiro plano nem em Portugal nem no mundo em geral) . As razões podem ser encontradas sob duas perspectivas. Por um lado, as empresas brasileiras só agora estão a ganhar massa crítica para competirem nos mercados internacionais e, por outro lado, o Brasil é um país de elevada dimensão com muito espaço económico interno por preencher, com um grau de incerteza inferior aos mercados internacionais mais maduros e competitivos. Releva também da figura que os valores do Investimento Directo do Exterior em Portugal em 2004 e 2005 da zona Euro são superiores aos do IDEP totais, o que significa que houve grandes desinvestimentos exteriores com origem extra zona Euro que foram compensados pelos elevados investimentos feitos em Portugal por países da zona Euro, nomeadamente pela Espanha (a Espanha é o maior investidor externo em Portugal e no período considerado apenas desinvestiu em Portugal em 1999, ano de crise acentuada na generalidade das economias mundiais).

Apesar do panorama algo sombrio que temos vindo a constatar, também se podem destacar alguns exemplos de sucesso e algumas boas iniciativas de grandes empresas portuguesas em território brasileiro, nomeadamente na banca, transportes, telecomunicações, energia, etc. Estes são alguns exemplos que podem servir de alavanca para que outros grupos possam encontrar incentivos (e precaver riscos) para investir no Brasil. Existem, contudo, alguns entraves reconhecidos pelos empresários portugueses e que condicionam a natureza e o grau dos investimentos a realizar. Em primeiro lugar surge a pesada burocracia inerente ao desenvolvimento de qualquer iniciativa empresarial. Em segundo lugar, a sistema fiscal brasileiro não é suficientemente homogéneo nos seus diversos estados nem motivador ao investimento exterior (não é por acaso que se considera que o melhor parceiro para executar negócios no mercado brasileiro é uma boa equipa de advogados). Também se podem referir as elevadas taxas de juro para empréstimos, que condicionam fortemente a obtenção de capital para investimentos. Em terceiro lugar a instabilidade política e social. Em termos de segurança, em 2004, 66% das vítimas de sequestros foram homens e, destes, 55% pertenciam ao mundo dos negócios.


Aspectos conclusivos e síntese

Em termos de comércio bilateral, os bens e serviços que Portugal produz de forma eficiente e que interessam ao Brasil são muito poucos (vinho, azeite, bacalhau,...). Em termos de investimento, Portugal nem sequer existe para um país que tem um mercado potencial equivalente a quase todo o mercado europeu, e que tem vindo a desinvestir no nosso país. Embora as relações bilaterais estabelecidas sejam fundamentais para os objectivos brasileiros (e o Brasil tem alguns acordos assinados com Portugal), aqueles que realmente preocupam e motivam o total empenhamento das autoridades brasileiras são os que têm um carácter instrumental dos objectivos estratégicos do Brasil no mundo a médio prazo, nomeadamente na reorganização das lideranças regionais e do papel comercial do Brasil na Organização Mundial do Comércio. Refiram-se os acordos estabelecidos em 2004 com a Índia (no âmbito de actividades ligadas à defesa, a sistemas de vigilância aérea e aeronaves), com a China, terceiro maior parceiro comercial do Brasil (em Maio de 2005 foram assinados 10 acordos de cooperação) e com a Rússia (o presidente russo afirmou publicamente, em Novembro de 2004, a intenção de triplicar o comércio bilateral com o Brasil). Por outro lado, continuam negociações intensas no âmbito da ALCA, do Mercosul, do G3, G20 e de acordos comercias com a União Europeia e a Organização Mundial do Comércio (OMC), para além de alguns acordos unilaterais com diversos países.

Repare-se que quando o governo brasileiro salienta como prioridade a afirmação internacional da sua agenda comercial, os aspectos relevantes dizem respeito às negociações em curso na ALCA, União Europeia (UE), Mercosul e OMC. Percebe-se que assim seja, uma vez que é nestas instâncias que se definem as “regras do jogo” e o Brasil necessita de alterar profundamente algumas dessas regras. Se o comércio é reconhecido como fonte de riqueza e bem-estar, também é verdade que a liberdade de comércio preconizada nos mercados mundiais e definida pelos países em desenvolvimento continua a ser demasiado proteccionista nos sectores em que os países mais pobres poderiam obter vantagens comparativas.

Já Portugal, que pretende fazer das exportações o seu motor económico, necessita muito de um país como o Brasil, quer em termos dos mercados potenciais internos quer das plataformas que pode estabelecer para toda a América Latina.

A Europa atravessa uma crise que não cria condições favoráveis ao crescimento das exportações portuguesas, tecnologicamente pouco avançadas e centradas nos sectores tradicionais do perfil de especialização português, há muito ultrapassado nos mercados internacionais. Neste sentido, as empresas portuguesas necessitam de diversificar a sua carteira exportadora para fora da Europa. O esforço das empresas e dos seus empresários tem por isso de se intensificar, nomeadamente ao nível dos bens e serviços produzidos, da sua incorporação tecnológica, da imagem que os produtos portugueses têm no exterior (que não é homogéneo), e da simbiose público-privado que potenciem trocas comerciais (aqui o papel da diplomacia económica não é despiciendo). Apenas dois exemplos: o governo brasileiro prevê a necessidade de criar novas fontes de energia ao ritmo de 4000 megawatts/ano capazes de suportar o nível de crescimento económico brasileiro. A exploração de novas energias (eólicas, biodiesel,...) poderá gerar oportunidades de negócios para os empresários portugueses, uma vez que as empresas brasileiras não possuem capacidade instalada para dar resposta à produção que se prevê necessária. Noutro sector, a agricultura brasileira, que representa um terço da economia nacional, só está a produzir a cerca de 20% da sua capacidade. Há bastante espaço para investimentos bem direccionados.


Em síntese

1. Na esfera económica (comércio e investimento), Portugal é pouco mais que irrelevante para o Brasil. No entanto, o Brasil é um espaço económico potencial que Portugal não pode deixar de considerar. Neste âmbito, cabe a Portugal tomar as iniciativas que defendam os seus interesses políticos e económicos;

2. Na esfera política e social (diálogo com a UE e política de imigração) parece que é o Brasil que tem mais a ganhar com a solidificação de acordos nesta matéria;

3. Neste sentido, cabe então aos responsáveis portugueses mostrar aos seus congéneres brasileiros que as acções, as medidas e os acordos na esfera política e social têm valor económico para a comunidade luso–brasileira.

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* Sérgio Nunes

Licenciado em Economia e Mestre em Economia e Gestão do Território pelo Instituto Superior de Economia e Gestão. Docente no Instituto Politécnico de Tomar.

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Dados adicionais
Gráficos / Tabelas / Imagens / Infografia / Mapas
(clique nos links disponíveis)

Link em nova janela Balança comercial de Portugal-Brasil

Link em nova janela Comércio com o Beasil (2004-2005)

Link em nova janela IDPE: Investimento Directo de Portugal no Exterior

Link em nova janela IDEP: Investimento Directo do Exterior em Portugal

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